Resumido por Jay Klender Worses
Introdução ao Estudo da História de Angola
Angola, o Fim da Guerra
Fria, e a Re-Africanização da África Austral
Amigo Leitor - Este capítulo
ainda em desenvolvimento
A mais longa guerra de
libertação nacional em África
O Regresso das Caravelas
Angola Lugar Quente da
Guerra Fria
O Fim da Rodésia, do
Sudoeste Africano e do Apartheid na África do Sul
O desmoronamento da Unuião
das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) e o Fim da Guerra Fria
Numa época mais recente,
podemos ainda relembrar o exemplo da relevância do petróleo de Angola na
economia mundial do Séc. XXI.
O Papel de Angola na Corrida à África e no
Estabelecimento de Impérios Coloniais
Amigo Leitor - Este capítulo
eastá ainda em desenvolvimento
Angola e o Colonialismo
Europeu
1795 escravatura abolida na
Holanda
1807 - tráfico de escravos
abolido na Inglaterra
1834 - Escravatura abolida
no Império Britânico
1867 - Os primeiros
diamantes são descobertos na África do Sul
1869 - Completa-se a
construção do Canal do Suez
A Revolução Industrial e o Imperialismo Europeu
A
Revolução Industrial foi um factor decisivo no imperialismo europeu. As
economias europeias precisavam não só de matérias primas e de mão-de-obra a
baixo custo, como precisavam também de novos mercados para os seus produtos
manufacturados. Os povos africanos ofereciam aos estados europeus a melhor
oportunidade de expansão não só pela sua proximidade geográfica e massa de
população, como também pelo facto de o continente africano não estar sob a
hegemonia de qualquer potência.
A Abolição da Escravatura e do Tráfico de Escravos
Assim,
a abolição da escravatura e do tráfico de escravos do Atlântico acontecerem tão
só por razões morais mas mais por razões económicas.
A
Inglaterra, refeita da perda das colónias da América, passou a concentrar os
seus esforços na expansão de novos mercados fornecedores de produtos tropicais
essenciais ao crescimento da sua indústria, ao mesmo tempo que novos mercados
consumidores eram necessários para a colocação dos seus produtos. Com efeito,
consciente da concorrência que lhe podia advir dos Estados Unidos da América,
nada melhor que advogar e policiar a abolição da escravatura e do tráfico, pois
tal reduziria a capacidade das antigas colónias Americanas de expandir a sua
economia, e deste modo desafiar a hegemonia britânica, pois o escravo era ainda
a principal fonte de riqueza nas Américas. Quanto às colónias espanholas e
portuguesas da América Central e do Sul, a estratégia britânica baseou-se no
suporte à onda de independência política que assolou a América Latina no
primeiro quartel do Século XIX e na abertura dos seus portos e economias às
mercadorias produzidas em Inglaterra.
Portugal e a Colónia de Angola
Este
paradigma fez-se reflectir em Portugal e nas suas colónias através da
independência do Brasil em 1822 e a consequente abertura dos seus portos ao
comercio internacional, e nas praças de África, na abolição do tráfico
negreiro. No caso particular de Angola, pode dizer-se que a expansão do domínio
português para o interior da colónia de Angola foi um dos primeiros resultados
da abolição da escravatura em Portugal mercê dos esforços do Marquês de Sá da
Bandeira em 1836.
Com
efeito a expansão territorial do domínio português em Angola começou em 1838,
com o estabelecimento do Forte do Duque de Bragança perto da quedas do mesmo
nome (Calandula),perto da confluência dos rios Lucala e Quanza. Dentro dos
próximos dez anos, os Portugueses estenderam o seu domínio até à margem do Rio
Cuando.
Entretanto
em 1840, era fundada a povoação de Moçâmedes, a sul de Benguela, e durante o
mesmo período os Portugueses tentaram a conquista dos povos da costa entre
Luanda e Cabinda (Ambriz, Ambrizete (Nzeto), e Santo António do Zaire (Soio),
não conseguindo porém os seus objectivos devido à oposição britânica.
Como
medida de estabelecer com melhor firmeza o seu domínio no reduzido território
que controlavam ao longo do Rio Quanza, os Portugueses impuseram um imposto
“por cabeça” que tinha de ser pago por africanos em moeda corrente ou em
produtos coloniais, obrigando-os assim a participar na economia colonial, o que
em breve resultou na expansão do domínio económico dos Portugueses às regiões
limítrofes do interior.
As Viagens de David Livingstone e o Imperialismo
Britânico
David
Livingstone nas suas viagens ao interior de África que desde 1852 tinham
assegurado um bom número de acordos de protecção britânica com muitos chefes
locais, alguns dos quais situados no território entre Angola e Moçambique,
agravou as diferenças entre Portugal e a Inglaterra que disputavam a vassalagem
dos povos da região. levando e o objectivo britânico de dominar todos os
territórios ao longo da faixa entre o Cabo (na África do Sul) e Cairo (no
Egipto) eram desafios que os Portugueses não podiam deixar de ignorar e atender
de imediato, sob pena do não reconhecimento pela comunidade internacional dos
seus direitos históricos, que não eram já reconhecidos por nenhum estado
europeu.
A Sociedade de Geografia de Lisboa
Em
1870 o Ministro da Marinha e do Ultramar português estabeleceu uma comissão
para preparar uma expedição por terra entre Angola e Moçambique com o fim de
reafirmar o domínio português sobre a longa faixa de território entre as duas
colónias. Com a criação da Sociedade de Geografia de Lisboa em 1875, o esforço
português em África ganhou um ímpeto muito grande, já que mobilizou um número
grande de comerciantes e industriais, estudiosos, missionários e oficiais
militares de carreira, e fazendo Portugal acordar para a realidade africana uma
geração após a independência do Brasil.
Melhores
meios financeiros e maiores recursos humanos foram postos à disposição pelo
governo português para estudo, ocupação e colonização de praças em África, e um
pequeno volume de emigração foi orientada para as novas colónias, em especial para
Angola e Moçambique.
O Acordo Luso-Britânico de 1884 sobre a Foz do Zaire
Assim
e pela mesma razão os Portugueses ocuparam o Antigo Reino do Congo em 1881 e
Cabinda e Massábi em 1883, como medida de afastar ou tentar neutralizar a
influência dos franceses a norte (Ponta Negra) e de Leopoldo II da Bélgica na
foz do rio Zaire (Boma e Matadi), que entretanto tinham estabelecido um número
de feitorias comerciais ao longo da costa.
Com
o objectivo de confirmar o seu domínio sobre a região, Portugal assinou um
acordo com a Inglaterra em 1884, em que a Inglaterra confirmava a pretensão
portuguesa. Contudo, tanto os Franceses com Leopoldo II da Bélgica montaram uma
oposição muito forte contra o acordo, não o reconhecendo de forma alguma, e até
argumentando ruídos de guerra. Face à oposição internacional e ao risco da
deterioração das suas relações com o resto da Europa, incluindo o risco de uma
nova guerra, o Parlamento Inglês não reconheceu o acordo com Portugal.
A Conferência de Berlim
Com
o objectivo de confirmar e haver reconhecidas as suas possessões em África,
especialmente os seus direitos históricos sobre a foz do Rio Zaire, Portugal de
iniciativa própria apelou ao Chanceler Alemão Otto von Bismark para a
realização de uma conferência internacional sobre a Bacia do Congo.
O
pedido de tal conferência, que tinha sido feita por Portugal já algumas vezes
em anos anteriores e tinha acabado em “ouvidos de mouco”, desta vez porém
capturou a atenção de Bismark, que se via preocupado com a expansão francesa e
inglesa em África, e com a falta de colónias alemãs em África.
Até
aquela altura, a posição oficial (embora não a de facto) do governo alemão era
que a Alemanha não estava interessada em colónias; contudo, a rápida ascensão
da Inglaterra como potência económica através da Revolução industrial,
convenceu Bismark que esta era a melhor oportunidade para a Alemanha se lançar
também na Corrida à África, com o objectivo de assegurar fontes de matérias
primas para a indústria alemã e de novos mercados para a sua economia
emergente, e também de despoletar uma situação internacional que se tornava
gradualmente mais explosiva.
A
conferência teve lugar em Berlim, entre 15 de Novembro de 1884 e 26 de Novembro
de 1885, durando os trabalhos quase um ano. Quatorze estados fizeram-se
representar - Suécia-Noruega (que estavam unidas até 1905), Dinamarca,
Inglaterra, Holanda, Bélgica, França, Alemanha, o Império Austro-Húngaro,
Itália, Espanha, Portugal, Turquia, Rússia, e Estados Unidos da América - dos
quais a França, a Inglaterra, a Alemanha e Portugal foram os mais
protagonistas.
A
conferência começou por discutir o estatuto internacional advogado para o delta
do Rio Níger e da foz do Rio Zaire, que passariam a ser abertas ao comércio
internacional, e não sujeitas a qualquer domínio colonial. Apesar do acordo
atingido no que respeita à neutralidade para a foz do Zaire, a grande bacia do
Zaire, incluindo a região do Baixo Congo (imediatamente a norte e Nordeste de
Angola) passou a ser colónia privada do Rei Leopoldo II da Bélgica, sob a
bandeira do Estado Livre do Congo.
A Corrida à África
Até
ao tempo da Conferência de Berlim, a presença europeia em África reduzia-se a
um número limitado de entrepostos costeiros, que tinham servido de portos
negreiros durante os 350 anos do tráfico de escravos do Atlântico, com a
excepção da presença portuguesa ao longo do curso do Rio Cuanza na costa
ocidental, e do Rio Zambeze na costa oriental, e da penetração Boer na colónia
do Cabo, no Transval e no Estado Livre de Orange na África austral.
É
certo que a descoberta de diamantes a norte do Transval em 1867 tinha atraído
um grande número de colonos à região, representando no todo menos de 10% da
superfície total do continente. A Conferência de Berlim foi a primeira
conferência global na história, na medida em que envolveu a maioria dos estados
mais desenvolvidos na época (Europa e Estados Unidos da América), se bem que
não tenha incluído qualquer estado da Ásia.
A
conferência adoptou ainda o princípio fundamental de ocupação efectiva do
território, pela qual a soberania de um estado colonizador sobre um território
colonial era somente reconhecida pela comunidade internacional, se o país
colonizador demonstrasse que tivesse uma presença efectiva que pudesse proteger
o comércio na colónia, tivesse uma administração colonial e uma presença militar
efectiva.
O
princípio da ocupação efectiva fez da África um manto de retalhos de colónias
europeias e resultou na configuração territorial das colónias não corresponder
às fronteiras dos estados tradicionais africanos, pela qual nações africanas
ficaram divididas entre várias colónias, e uma mesma colónia incluir estados
tradicionais africanos inimigo tradicionais.
Impérios e Colónias
Após
a Conferência, a África ficou assim dividida: Para a Inglaterra, o eixo de
colónias do Cabo ao Cairo, incluindo o Sudão, Uganda, Quénia, Rodésia e
Niassalândia (Zâmbia, Malawi, e Zimbabwe), Bechuanalândia (Botsuana), e
Suazilândia (Lesoto), e as colónias da Costa do Ouro (Gana) e Nigéria.
A
França ficou com a maior parte da África Ocidental, da Mauritânia ao Chade, e
as colónias do Gabão e do Congo Francês (Brazzaville) na África Central.
A
Alemanha ficou com a colónia do Togo no Golfo da Guiné, Sudoeste Africano
(Namibia), e Tanganica (Tanzânia).
O
Rei Leopoldo II da Bélgica viu confirmada a sua soberania sobre of Estado Livre
do Congo (Congo Kinshasa).
Portugal ficou com Angola na
costa ocidental e Moçambique na costa oriental. A Itália ficou com a
Somalilândia (Somália) e parte da Etiópia.
A Espanha ficou com a
pequena colónia da Guiné Equatorial (Rio Muni).
Introdução - Razões
históricas da Presença portuguesa em África Angola e a Conferência de Berlim.
Os Escravos de Congo e Angola e a Ascensão da Hegemonia
Europeia
Começamos
por relembrar que, como resultado do Tratado de Tordesilhas firmado entre
Portugal e Espanha em 1494, os dois reinos ibéricos dividiram o mundo entre si,
cabendo aos Portugueses o hemisfério oriental incluindo a África com a sua
riqueze em ouro e marfim, e com o seu manancial quase infinito de mão-de-obra,
e a Índia com possibilidades infinitas no comércio das especiarias. Os
Espanhóis, por seu lado, ficaram com o hemisfério ocidental que incluia os
ricos depósitos de ouro e prata nas Américas e com o comércio do Pacífico,
incluindo as Ilhas Molucas (Filipinas) no Extremo Oriente; contudo sem uma
oferta abundante, rentável e segura de mão-de-obra, que podia ser fornecida
somente pelos Portugueses.
Portugal
foi o primeiro estado europeu a estabelecer colónias de base agrícola nas novas
terras descobertas, inicialmente no Atlântico (Madeira), depois em África (São
Tomé) e mais tarde na América do Sul (Brasil); contudo, com uma população
relativamente escassa e tendo em atenção o sorvedouro de gente que a empresa da
Índia requeria, os Portugueses depressa concluiram que a empresa da colónia
agrícola de plantação era de facto muito rentável, mas que requeria outra fonte
de mão-de-obra que não somente colonos portugueses, descobrindo assim o papel
fundamental que o escravo africano haveria a desempenhar neste novo sistema
económico mundial.
Convém
aqui lembrar que em termos relativos de emigração (emigração em relação à
população), emigraram mais Portugueses para a Índia, para o Brasil e para
África, que todos os emigrantes Espanhois, Ingleses, e Franceses juntos para as
Américas.
No
que respeita à fonte (oferta) de mão-de-obra, os Portugueses usaram escravos
africanos primeiro na produção de açúcar na Ilha da Madeira, e depois na Ilha
de São Tomé, onde ganharam a experiência na captura, transporte e venda de
escravos africanos da costa ocidental de África para regiões distantes.
O
lucro do tráfico negreiro depressa convenceu os Portugueses a estabelecerem
feitorias para o tráfico de escravos ao longo da costa africana. Estabeleceram
assim a feitoria de Arguim na costa ocidental, e em 1481 construiram o Forte de
São Jorge da Mina - um projecto de construção verdadeiramente revolucionário
para a época, pois os edifícios do forte foram todos pré-fabricados em
Portugal, e os componentes foram "reconstruídos" por um grande
contingente de pedreiros e carpinteiros portugueses, que em ecomissão de
serviço, tinham sido contratados para completar a construção do forte no local.
A
Corôa portuguesa entretanto tinha aperfeiçoado o regime de venda de privilégios
reais a feitores para o tráfico negreiro nas costas de África. Esta experiência
mostrou-se valiosa nos primeiros "asientos" (contrato de fornecimento
de escravos) que Filipe II de Espanha (I de Portugal) já no tempo da União Ibérica
conferiu em 1595 a negreiros de transportarem escravos das regiões de captura
em África directamente para as minas de ouro no México, estabelecendo-se assim
o que mais tarde se veio a designar pelo tráfico de escravos do Atlântico, e no
qual Portugal viria a desempenhar o papel mais destacado na sua primeira fase.
Com
a derrota da Armada Invencível da União Ibérica no Canal da Mancha em 1588,
Portugal perdeu grande parte da sua marinha de guerra e mercante e com elas o
seu primeiro império colonial - a Índia. Para Portugal havia assim que
reagrupar depressa e encontrar outra fonte de riqueza essencial para o sustento
da sua economia, o que se veio a concretizar com a rápida expansão da cultura
do açúcar (a famosa cana mélica do Levante) no Brasil. Nasceu assim o segundo
império português - o Brasil - que havia de perdurar até ao Grito do Ipiranga
(declaração de Independência do Brasil) em 1822.
O Escravo de Angola no Ciclo do Açúcar
do Brasil no Século XVII
Como
bem disse o Padre António Vieira em meados dos Séc. XVII na sua campanha de
angariar suporte para a retomada pelos Portugueses das fontes de escravos na
África Central (São Jorge da Mina, São Tomé, Loango, Cabinda, Malembo, Sonho,
Luanda e Benguela)"Sem Negros não há Pernambuco e sem Angola não há
Negros!".
A
mais-valia extraída do trabalho dos escravos de Angola foi o fulcro principal
que sustentou a economia açucareira do Brasil no Século XVII, a mineira no
Século XVIII, e a cafeeira até aos fins do Século XIX. Durante estes três
séculos o Brasil desenvolveu um papel fundamental no quadro da economia
mundial, ao mesmo tempo que o trabalho do escravo Angolano era o agente
principal da criação da riqueza no Brasil e da contribuição deste para a
economia mundial.
Em
termos estatísticos muito sumários, estima-se que durante o período do tráfico
de escravos do Atlântico (entre 1519 e 1867), tenham sido levados de Angola e
da Bacia do Congo mais the 5 milhões de pessoas, a uma média mensal de cerca de
1.250 (ou média diária de cerca de 40 escravos), perfazendo cerca de 44% da
exportação de escravos de África. Cerca de 10.000 escravos chegava em média
anualmente ao Brasil. Em termos do total para o tráfico de escravos do
Atlântico, de 1519 a 1867, 11,6 milhões de homens, mulheres e crianças foram
levadas do interior de África para as Américas, 3,3 milhões morreram no
percurso entre a sua região de origem e o porto negreiro na costa, e 1,5
milhões morreram na Passagem do Meio (travessia do Atlântico). O número total
de pessoas escravizadas e vendidas ou que morreram no tráfico do Atlântico
sómente, excluindo o número de escravos exportados para o Norte de África e
estados árabes e o número de escravos exportados para o Irão, Índia, e para o
resto da Ásia, estima-se em mais de 15 milhões.
Ainda
que em forma muito sumária, penso que é útil delinear aqui a estrutura da
economia mundial dos séculos XVII e XVIII e o papel que Angola e o Brasil
desempenharam na mesma.
Os Holandeses no Atlântico Sul
Vazios
de homens e de capitais, de equipamento e de meios de transporte, os
Portugueses tiveram que financiar a empresa do açúcar brasileiro com
empréstimos concedidos por banqueiros e comerciantes Holandeses, para a compra
de equipamento produzido na Holanda, ao mesmo tempo que o transporte do açúcar
brasileiro para a Europa e dos escravos de África para o Brasil eram feitos
também em navios holandeses.
O
influxo de capitais para os Países-Baixos foi por sua vez sustentado em grande
parte por Judeus (Cristãos-Novos) que tinham sido expulsos da Península Ibérica
e que se haviam refugiado nos Países-Baixos. Porém, é importante relembrar que
desde os primórdios da colonização das Américas os Holandeses adoptaram uma
stratégia económica nacional com base no comércio ultramarino. Com a fundação
das companhias de comércio ultramarino (as percursoras das actuais sociedades
anónimas), os Holandeses desde a partida asseguraram o monopólio do comércio
com a Ásia, a África e as Américas no Século XVII. A sua frota marítima era
constituída por navios de maior tonelagem e de menor tripulação, o que rendia
maiores lucros, e nos finais do Século XVII a sua frota mercante era maior que
as frotas da Inglaterra, da França, da Alemanha, e de Portugal combinadas.
Pela
sua oportunidade e importância, transcrevo a seguir um trecho da "Formação
Económica do Brasil", páginas 10 e 11, do Professor Celso Furtado,
recentemente falecido, cuja obra considero a mais importante de todos os
economistas de língua portuguesa:
"A
partir da metade do Século XVI a produção portuguesa de açúcar passa a ser mais
e mais uma empresa em comum com os flamengos, inicialmente representados pelos
interesses de Antuérpia e em seguida pelos de Amsterdã. Os flamengos recolhiam
o produto em Lisboa, refinavam-no e faziam a distribuição por toda a Europa,
particularmente o Báltico, a França e a Inglaterra.
A
contribuição dos flamengos - particularmente dos holandeses - para a grande
expansão do mercado do açúcar, na segunda metade do Século XVI, constitui um
fator fundamental do êxito da colonização do Brasil. Especializados no comércio
intra-europeu, grande parte do qual financiavam, os holandeses eram nessa epoca
o único povo que dispunha de suficiente organização comercial para criar um
mercado de grandes dimensões para um produto práticamente, como era o açúcar.
E
não sómente com a sua experiência comercial contribuíram os holandeses. Parte
substancial dos capitais requeridos pela empresa açucareira viera dos
Países-Baixos. Existem indícios abundantes de que os capitalistas holandeses
não se limitaram a financiar a refinação e comercialização do produto. Tudo
indica que os capitais flamengos participaram no financiamento das instalações
produtivas no Brasil bem como no da importação da mão-de-obra escrava.
Se
se tem em conta que os holandeses controlavam o transporte (inclusive parte do
transporte entre o Brasil e Portugal), a refinação e a comercialização do
produto depreende-se que o negócio do açúcar era na realidade mais deles do que
dos portugueses. Somente os lucros da refinação alcançavam aproximadamente a terça
parte do valor do açúcar em bruto."
Animados
com o êxito da Companhia das Índias Orientais na Insulíndia (Indonésia actual)
e com a derrota dos Portugueses na Índia e a sua fraqueza militar e económica
no Brasil e em África, os Holandeses depressa adoptaram a mesma solução para o
domínio do Atlântico Sul, o que levou primeiro ao estabelecimento da Companhia
Privilegiada da Índias Ocidentais em 1621 e à conquista de Salvador da Bahia em
1624 (retomada pelos Portugueses e Espanhois no ano seguinte), de Recife (na
Capitania de Pernambuco) em 1630, e poucos anos depois a costa entre Sergipe e
o Maranhão.
Cientes
da necessidade de assegurar uma oferta abundante, segura e barata de escravos
africanos, os Holandeses tomaram aos Portugueses em 1637 o Forte de São Jorge
da Mina no Golfo da Guiné, e mais tarde em 1641 a Ilha de São Tomé e a colónia
de Angola (Cabinda, Pinda (Soyo), Luanda e Benguela), que eram já os principais
portos negreiros fornecedores de escravos na costa africana a sul do equador
para a indústria do açúcar brasileira. Em 1652 os Holandeses fundaram a Colónia
do Cabo (na África do Sul de hoje) como posto de reabastecimento ás suas
carreiras para a Insulíndia e base militar para policiamento do Atlântico Sul.
O
sucesso batavo nesta empresa foi assinalável, já que por 24 anos, os holandeses
tomaram aos Portugueses as sete capitanias mais prósperas da costa brasileira,
embora nunca tenham sido capazes de expulsar completamente os Portugueses do
Brasil. O apogeu do domínio batavo do Brasil teve lugar durante o consulado do
Príncipe João Maurício de Nassau (1637 a 1644), que em poucos anos transformou
a cidade do Recife, capital de Pernambuco e sede do governo holandês, numa das
cidades mais modernas e cosmopolitas do mundo de então.
El Cerro Rico de Potosi
A
descoberta da América por Cristóvão Colombo em 1492 e da descoberta do Brasil
por Pedro Álvares Cabral em 1500 (em que o debate está ainda em aberto se a
viagem de Pedro Álvares à costa brasileira foi acidental, se planeada, ou mesmo
se Duarte Pacheco Pereira já lá tinha chegado poucos anos antes), abriram o
Novo Mundo à Espanha e Portugal. Estas descobertas foram um tanto acidentais,
pois os dois estados ibéricos encontraram as Américas como um corolário
inesperado na procura de uma rota marítima ocidental para a Índia, e daí o
termo "Índio" dado aos habitantes nativos do Novo Mundo.
Os
primeiros contactos com os habitantes do Novo Mundo não levaram ao
estabelecimento de qualquer comércio de monta de imediato, ao contrário da
experiência dos Portugueses em África e na Índia. A única excepção de nota foi
a exploração do pau brasil ao longo da costa oriental da América do Sul, mais
tarde designada Brasil, termo com raíz na palavra francesa cor de braza /
vermelha do pau que se passou a usar na produção de corante de tinturaria para
a crescente indústria textil francesa sediada em Rouen e na Flandres.
Os
Espanhois, por seu lado, procuravam em vão uma passagem por terra para o
Ocidente, através do novo continente. A primeira colónia permanente no Novo
Mundo foi estabelecida por Cristóvão Colombo na sua segunda viagem, na costa
norte da Ilha Hispaniola, onde se fez o traçado para uma cidade, o governo
municipal foi estabelecido, e terra foi dividida entre os colonos espanhois,
que com a atribuição da terra, recebiam também um número de nativos para
trabalhar a terra (encomienda).
A
cana de açúcar foi introduzida cedo na Ilha Hispaniola (hoje República
Dominicana e Haiti) em 1493, e em 1520 havia 28 engenhos activos na produção de
açúcar. Em 1513 foi encontrado ouro na costa sul da Hispaniola, o que despertou
o interesse da corôa espanhola.
Ainda
em 1513 Juan Ponce de Leon reconheceu a costa da Florida e Vasco Nunez de
Balboa atravessou o istmo do Panamá e avistou o Oceano Pacifico. Em 1516 Juan
Díaz Solis explorou a foz do Rio da Prata. Em 1518 a costa da Península do
Yucatan foi reconhecida por Francisco Hernandez de Córdoba e Juan de Grijalva.
Após
Fernão de Magalhães ter provado em 1521 através da sua viagem de
circum-navegação que as Molucas (parte do arquipélago das Ilhas Filipinas) se
podia atingir pelo ocidente, a estratégia colonial espanhola mudou. Constatada
que foi a duração e custo de tal viagem, a corôa espanhola concentrou os seus
esforços na procura de metais preciosos no Novo Mundo, e relegou para segundo
lugar a preocupação de competir com os Portugueses no comércio das especiarias
da Insulíndia. Como sabemos Fernão de Magalhães não chegou a cumprir a viagem
pois foi morto numa escaramuça com os nativos das Ilhas Cebú, o que não lhe
tira o crédito de ter planeado e comandado a expedição mais difícil até hoje
realizada na exploração do planeta.
Em
1521 Hernán Cortés conquistou o México e surpreendeu o mundo com a quantidade
de ouro e prata obtida dos povos conquistados, com valor muito superior a
qualquer comércio de especiarias com a Índia. A conquista do México mudou a
estratégia dos Espanhois no Novo Mundo. Não importava jamais procurar e
desenvolver o comércio, já que a riqueza em ouro e prata tudo suplantava. Assim,
assistimos à acção dos Conquistadores em procura do El Dorado, que com colunas
militares relativamente pequenas conquistaram impérios imensos no Novo Mundo.
A
conquista da América Central foi completada em 1525, e por cerca de 1543, os
Espanhois dominavam mais de metada do território da América do Norte, entre as
Carolinas na costa atlântica e o Oregon na costa do Pacífico. Em 1531 Francisco
Pizarro completou a conquista do Império Inca e surpreendeu ainda mais o mundo
com a riqueza em ouro e prata do despojo da conquista de Cuzco e Machu Pichu,
em valor muito mais elevado que o arrecadado por Hernán Cortés no México.
Devido
à sua riqueza o Perú passou desde a sua conquista a ser o centro principal da
expansão Espanhola nas Américas. Por outro lado, nas Caraíbas, a cidade de
Havana, fundada em 1519 desde cedo se tornou o centro da expansão Espanhola nas
Caraíbas, e Buenos Aires, fundada em 1536, tornou-se o centro da expansão do
interior da América do Sul, a partir da foz do Rio da Prata. Em 1545 os Espanhois
descobriram a mina de prata de Potosi, numa região remota e montanhosa do Perú
(na região que mais tarde se havia de chamar Bolívia), talvez a mina mais rica
do mundo. Outras descobertas de minas muito ricas se fizeram em seguida,
tornando-se a América Espanhola o maior produtor de ouro e prata do mundo de
então.
A
riqueza em ouro e prata do Perú e do México foi decerto o elemento chave do
arranque económico do império Espanhol no Novo Mundo; contudo, a agricultura e
pecuária foram as actividades que possibilitarm a dominação efectiva dos
Espanhois sobre um território tão vasto. A mão-de-obra nativa, utilizada
inicialmente na forma de "encomiendas" provou não ser solução
suficiente para a crescente procura de mão-de-obra para trabalhar as minas.
Tornou-se então necessário recorrer ao trabalho escravo de africanos, que em
número sempre crescente, depressa substituíu a mão-de-obra nativa (Índia).
Assim,
no Novo Mundo os escravos africanos depressa não eram só essenciais à produção
de açúcar do Brasil; eles tornaram-se também imprescindíveis às minas de ouro
do e prata do México, e às minas de prata do Perú e da Bolívia (a serra de
prata de Potosi). Em termos muito sumários as minas da América Espanhola
absorveram durante o período do tráfico de escravos do Atlântico mais de 2,6
milhões de africanos (à razão de cerca de 7.500 por ano), o que levou a União
Ibérica (Espanha e Portugal) a concentrar os seus esforços na reconquista
imediata da Bahia, Pernambuco e Maranhão aos Holandeses.
Assim,
em 1625, coadjuvados pelos Espanhois, os Portugueses conseguiram reunir a mais
poderosa esquadra naval jamais vista no Atlântico Sul (52 navios e 12.000
homens) e reconquistaram Salvador da Bahia (que era a sede do poder Português
no Brasil), e com a ajuda dos Portugueses do Rio de Janeiro, reconquistaram
Luanda, Benguela e São Tomé em 1648.
Contudo,
os Holandeses mantiveram o controle sobre os dois portos negreiros estratégicos
do Forte de São Jorge da Mina e de Loango, que dominavam o comércio negreiro no
Golfo da Guiné. Este esforço veio a materializar-se com a expulsão definitiva
dos Holandeses de Angola e São Tomé em 1648 e do Brasil (Recife, Pernambuco) em
1654, e a consequente restauração do domínio português (mais própriamente, o
domínio brasileiro) do Atlântico Sul.
Salvador Correia de Sá e a Restauração
do Domínio Português no Atlântico Sul
XXXXX
- Ainda em desenvolvimento
A Ascensão da Economia de Plantação nas
Antilhas
Depois
da sua expulsão do Brasil, mas ainda cientes do seu controle sobre a economia
açucareira, os Holandeses deixaram o Brasil mas não sem levarem consigo a
tecnologia, o capital, o equipamento, e as fontes de escravos africanos, e
mudaram-se para as Antilhas, onde depressa estabeleceram plantações que em
poucos anos suplantaram o volume de produção do açúcar brasileiro, o que veio a
resultar numa baixa mundial de preços do açúcar muito longa que se traduziu
numa crise económica muito longa e profunda da economia açúcareira brasileira
da qual jamais se haveria de recuperar.
De
facto, com fontes de capital e mão-de-obra asseguradas, com maquinaria e
equipamento novo e mais moderno, e com custos de transporte mais baixos do
açúcar para a Europa e as Colónias Americanas devido à maior proximidade entre
as regiões produtoras (Antilhas) e as de consumo (Europa), os Holandeses
depressa retomaram o comando da produção e comércio mundial de açúcar, e com
isto despertaram o interesse da Inglaterra e da França para fazerem o mesmo,
deixando os Portugueses no Brasil na difícil posição de terem de competir num
mercado em que os preços estavam numa baixa de longa duração, enquanto os seus
custos de produção continuavam a cresecer, e a distância de mercados obrigava a
custos de transporte mais elevados.
Seguindo
o exemplo dos Holandeses, em breve os Ingleses e Franceses tomaram aos
Espanhois as ilhas mais importantes nas Antilhas, com a excepção das ilhas de
Cuba e Porto Rico, estabelecendo promissoras colónias de plantação de açúcar no
Haiti (França), na Jamaica e em Barbados (Inglaterra). Com um excedente de
população relativamente grande, a Inglaterra depressa copiou e expandiu o
modelo de plantação de açúcar levado pelos Holandeses para as Antilhas, que
passou a incluir também plantações de tabaco e anil nas ilhas, e de algodão nas
Colónias Americanas mais meridionais (Virginia, as Carolinas e a Geórgia) no
continente americano.
Antes
de recorrerem ao tráfico de escravos africanos através do Atlântico, os
Ingleses usaram primeiro o excedente da sua própria população nas suas Ilhas
Britânicas com fonte principal de mão-de-obra para as suas novas colónias nas
Antilhas e na América. Como resultado das profundas transformações económicas
na agricultura inglesa (o regime de propriedade cercada (enclosures) para a
criação de grandes rebanhos de carneiros para a produção industrial de lã nas
cidades), grande número de trabalhadores da terra viram-se sem possibilidades
de sobrevivência nos campos, não tendo outro recurso senão tentarem melhor
sorte nas cidades, para onde emigravam em grande número, e oferecerem a sua
força de trabalho no Novo Mundo através de contratos de regime de servidão
temporária de cinco a sete anos (indenture), a troco do pagamento da passagem,
comida e dormida durante o termo do contrato, e no final deste, um pedaço de
terra no Novo Mundo, ou um pequeno montante em dinheiro, que podiam investir
eles próprios em pequenas fazendas ou comércio.
É
importante salientar aqui que as condições de trabalho para os trabalhadores
ingleses em regime de servidão temporária nas Antilhas e nas Colónias
Americanas não eram melhores que as do escravo africano, na medida em que o
trabalhador em regime de servidão temporária era mais barato que o escravo de
África, e a sua oferta em número era muito maior que a procura. A estes
factores devemos adicionar o facto que os donos das plantações de açúcar viam
os trabalhadores em regime de servidão temporária como possível concorrência à
sua posição de poder no quadro económico local e regional, de forma que nunca
fizeram o tempo do contrato um período aprazível ou atraente ao trabalhador
emigrante.
Porém,
devido à concorrência militar entre a Inglaterra e a França no Novo Mundo, e ao
estado mais ou menos constante de guerra entre elas, este excesso de população
passou a ser usado também na guarnição de fortes espalhados pelo mundo e no
número crescente de navios de guerra necessários para manter a sua hegemonia,
em vez de continuar a ser canalizada para a economia de plantação nas Antilhas.
Esta redução crescente da oferta de mão-de-obra para as plantações nas Antilhas
e na América levou a Inglaterra e a França a embarcar também no negócio do
tráfico de escravos africanos em grande escala, e que em breve haviam de
desafiar a supremacia histórica portuguesa no tráfico negreiro.
O Desenvolvimento das Colónias Inglesas
na América
Com
o rápido desenvolvimento económico e populacional das Antilhas, os Ingleses
encontraram nas colónias da Nova Inglaterra (New England - Maine, New Hampshire,
Massachussets, Rhode Island, New York, Pennsylvania, Delaware e Maryland), a
região ideal para a produção de artigos de consumo e de capital (cereais,
batata, madeira, vestuário, ferramentas, equipamento, e navios) para venda nas
Antilhas, a um preço mais baixo que os produtos produzidos na Europa, já que os
custos de mão-de-obra eram mais baixos na América e o custo do frete marítimo
era muito menor, devido a maior proximidade da América em relação às Antilhas,
do que a distância longa e perigosa entre as Antilhas e a Europa.
Da
interacção de todos estes factores resultou o rápido desenvolvimento económico
e populacional das Colónias Americanas, que cedo se estabeleceram com o mercado
fornecedor da maioria dos bens necessários (bens de consumo e de capitais) às
economias de plantação nas Antilhas e as colónias emergentes no centro e sul do
continente norte-americano. Do mesmo modo, as colónias do Sul (Virgínia,
Carolinas e Geórgia) cedo se especializaram na produção de tabaco, arroz, e,
principalmente, algodão, que em breves anos se tornaram a principal região
produtora de algodão e abastecedora das economias emergentes no Novo Mundo, em
África, e principalmente na Europa.
O Ciclo do Ouro no Brasil
A
descoberta de ouro no Rio das Velhas (Ouro Preto) e em Vila Rica nos últimos
anos do Século XVII e de diamantes em 1723 em Cerro do Frio, na Capitania de
Minas Gerais, no Brasil, anos mais tarde salvou a independência política de
Portugal por mais de um século, ao mesmo tempo que, irónicamente, relegou a
economia lusitana para um estado de subdesenvolvimento crónico que havia de
perdurar quase três séculos.
Isto
porque os rendimentos do "quinto" arrecadado do ouro do Brasil pela
corôa portuguesa foram suficientemente abundantes para Portugal poder continuar
como estado independente, ao mesmo tempo que enfeudaram a economia portuguesa
ao domínio da inglesa, através dos tratados de 1654 e de Methuen em 1703, pelos
quais o suporte militar inglês era garantido a custo da ausência completa de
qualquer indústria agrícola ou transformadora de relevo em Portugal e sujeição
absoluta à indústria inglesa.
Assim,
o ouro do Brasil não parava sequer em Lisboa; era imediatamente re-exportado
como pagamento para as importações inglesas, ao passo que o papel de Portugal
na economia europeia era reduzido à produção de vinho do Porto para exportação,
cuja indústria e comércio eram por sua vez controlados por mercadores ingleses.
O Escravo Angolano na Economia Mineira
do Brasil
YYYY
- Ainda em desenvolvimento
"O
Brasil era o paraíso para o Mulato, Purgatório para o Branco, e Inferno para o
Negro"
Eduardo
Bueno "Terá sido o pior lugar do mundo, o ventre da besta e o bojo da
fera, embora para aqueles que eram responsáveis por ele, não estavam lá, fosse
o mais lucrativo dos depósitos e o mais vendável dos estoques. No porão dos
navios negreiros que por mais de trezentos anos cruzaram o Atlântico, desed a
costa oeste de África até à costa nordeste do Brasil, mais de três milhões de
africanos fizeram uma viagem sem volta, cujos horrores geraram fortunas
fabulosas, ergueram impérios familiares e construíram uma nação. O bojo dos
navios da danação e da morte eram o ventre da besta mercantilista: uma máquina
de moer carne humana, funcionando incessantemente para alimentar as plantações
e os engenhos, as minas e as mesas,a casa e a cama dos senhores - e, mais do
que tudo, os cofres dos traficantes de homens.
Um
único exemplo. Em 1841, a belonave inglesa Fawn, capturou na costa brasileira,
o navio Dois de Fevereiro. Desde 7 de Dezembro de 1831, o tráfico era ilegal no
Brasil e navios de guerra britânicos patrulhavam o litoral. Após a apreensão do
tumbeiro, o capitão do Fawn anotou, no diário de bordo a cena com o qual se
deparou nos porões da embarcação: "Os vivos, os moribundos e os mortos
amontoados numa única massa. Alguns desafortunados no mais lamentável estado de
varíola, doentes com oftalmia, alguns completamente cegos; outros esqueletos
vivos, arrastando-se com dificuldade, incapazes de suportarem o peso dos seus
corpos miseráveis. Mães com crianças pequenas penduradas em seus peitos,
incapazes de darem a ela uma gota de alimento. Como os tinham trazido até
aquele ponto era surpreendente: todos estavam completamente nús. Seus membros
tinham escoriações por terem estado deitados sobre o assoalho durante tanto
tempo. No compartimento inferior o mau-cheiro era insuportável. Parecia
inacreditável que seres humanos sobrevivessem naquela atmosfera".
Portugal, a Inglaterra e o Tratado de
Methuen
Por
outro lado, o que restava da riqueza do ouro foi aplicada em Portugal em
investimentos supéfluos e retrógrados como o Convento de Mafra, em vez de serem
canalizados para investimentos na agricultura, na indústria ou na renovação da
frota marítima, que haveriam de valorizar a economia. Para a Inglaterra, os
lucros imensos das exportações para Portugal foram um factor chave para a
rápida industrialização inglesa, pois permitiram uma acumulação de capital
muito rápida e extensa, o que constituiu o impulso inicial para a Revolução
Industrial Inglesa já nos princípios do Século XIX.
O
Marquês de Pombal caracterizou bem esta relação económica quando disse
"que a Inglaterra havia reduzido Portugal a uma situação de dependência,
conquistando o reino sem os incovenientes de uma conquista militar, em que
Portugal tinha de importar tudo", relembrando até que "os escravos
que trabalhavam nas minas do Brasil tinham que ser vestidos pelos
Ingleses"(citado por Celso Furtado).
Como
resultado do afluxo ao mercado de quantidades imensas de ouro do Brasil à
Inglaterra (via Portugal), Londres substituiu Amsterdão como o maior centro
financeiro do mundo, lugar cimeiro que havia de ocupar por mais de duzentos
anos.
Referência Bibliográfica
Professor
Celso Furtado "Teoria e Política do Desenvolvimento Económico",
edição portuguesa das Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1971, o clássico
"Formação Económica do Brasil" 17a. edição da Editora Nacional, São
Paulo, 1980, e "A Economia Colonial no Brasil dos Séculos XVI e
XVII", publicado pela Editora Hucitec, São Paulo, 2000;
Recomendo
ainda a consulta da obra extensa do Professor Charles Ralph Boxer, também
recentemente falecido, da qual realço o clássico "The Portuguese Seaborn
Empire 1415 - 1825" originalmente publicado em 1969, e recentemente
publicado pela editora Carcanet em cooperação com a Fundação Calouste
Gulbenkian e a Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos
Portugueses. Esta obra é talvez a melhor análise da expansão portuguesa no
mundo, e está traduzida em Português, tendo sido publicada no Brasil e em
Portugal;
a obra "Salvador de Sá and
the Struggle for Brazil and Angola 1602 - 1686", publicada pela University
of London e a Athlon Press, London, 1952; e a obra "The Golden Age of
Brazil - Growing Pains of a Colonial Society 1695 - 1750", publicada pela
St. Martin's Press, New York, 1995.
Sugiro
ainda a consulta de dois estudos muito bons de história económica: a obra
clássica de J. Lúcio de Azevedo "Épocas de Portugal Económico", 3a.
edição da Livraria Clássica Editora, Lisboa, 1973; a obra fundamental do
Professor Vitorino Magalhães Godinho "Os Descobrimentos Portugueses e a
Economia Mundial", 2a edição publicada pela Editorial Presença, em Lisboa,
1983;
E,
finalmente, a obra de Caio Prado Júnior "Histórica Económica do
Brasil", publicado pela Editora Brasiliense, 46a. reimpressão, São Paulo,
2004.
Recomendo
sobretudo a leitura da obra magnífica de divulgação histórica de Eduardo Bueno
"Brasil: uma história - a Incrível Saga de um País", 6a. impressão da
Editora Ática, São Paulo, 2005, pois além do seu excelente conteúdo, nos
presenteia com uma colecção impressionante the gravuras e imagens da história
do país irmão.
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