Alambamento e o casamento
tradicional angolano
Mais
importante do que o casamento civil ou religioso, o alembamento tem o peso da
tradição. Em Angola, é visto como uma cerimónia fundamental, alembamento é a
entrega dos dotes exigidos pela família da noiva à família do noivo.
Panos
africanos, carta de pedido, dote e presentes simbólicos definem o casamento
tradicional africano. Em Angola, o alembamento
vai muito além de anel no dedo, muito além de um joelho dobrado apoiado
no chão. É um enlace de grande importância, uma vez que enaltece a família e é
visto como o ‘pilar’ da felicidade.
Alembamento
é um costume tradicional ou casamento tradicional que consiste na celebração de
uma cerimónia em que o homem se torna esposo da mulher, mediante rituais, tendo
em conta os costumes regionais", diz Melo Mendes, aluno do mestrado em
Direito Constitucional, na Universidade Autónoma de Lisboa.
Hoje,
há certas mudanças neste casamento típico angolano, o que leva muitas vezes a
confundir alembamento com pedido de casamento. Jobe José, bancário de 36 anos,
explica essa diferença: "Alembamento é uma exigência que os familiares
fazem. Existe uma lista da família da noiva, onde são exigidas certas coisas
como fatos, bebidas, calçado, até mesmo galinhas, se for preciso. O pedido
consiste numa apresentação, onde se pede consentimento para casar.
Melo
Mendes, embora muito jovem, encontra-se já no terceiro alembamento. "A
primeira vez, teve mesmo que ser. A rapariga engravidou e fui obrigado a fazer
alembamento, porque a tradição assim o exige…" ‘Pular à janela’ é o termo
que se usa quando a rapariga engravida antes do casamento. Nestes casos, é
atribuída uma multa por parte da família da jovem à família do rapaz. Em
Angola, em 90 por cento dos casos de gravidez é exigido alembamento.
O PEDIDO
Ramos,
34 anos, licenciado em Psicologia Organizacional, deu recentemente este passo.
Actualmente vive em Lisboa com Rui Marcelina Ramos, de 28 anos, licenciada em
Ciência Política e Relações Internacionais e recentemente mestre em Globalização
e Ambiente.
Sendo
africano, tinha que preencher todos os requisitos que tem o casamento como
ponto mais alto da vida, neste caso o pedido”, diz Rui Ramos. O psicólogo
reforça a ideia de alembamento de forma bastante coerente: "O alembamento
é, acima de tudo, respeitar a tradição para abençoar a união. Alembamento é a
raiz e o pedido é o caule. Normalmente, nos centros urbanos, não há grande
aceitação ou tolerância para com o que é tradicional. Tudo que é tradicional
tem por origem e como origem o interior, o que é rural, tem o seu ícone nos
sobas. Para mim, alembamento é uma manifestação social e rural. Mesmo no
alembamento, há características que encontramos no pedido.
Daí
considerar que o pedido é uma extensão moderna do alembamento. Pedido é algo
urbano, algo dos centros, das pessoas que viajam, das pessoas que têm acesso a
outros mundos.
Rui
e Celma, como é conhecida a noiva, encontraram alguns obstáculos para a
concretização do alembamento, uma vez que ambos vivem em Portugal e a maioria
dos familiares em Angola. "A família queria que tudo se realizasse em
Luanda só que, para nós, não convinha, porque chegámos a Lisboa em tenra idade.
As nossas raízes, em termos de identificação, companheirismo, pessoas mais
chegadas, estão aqui. O que temos em Angola é só mesmo o respeito pelo conceito
da palavra ‘família’. O pedido, por uma questão tradicional e de respeito, é
uma comemoração para a família, os noivos não têm voz, não têm ideias, não têm
vontades, tudo é como eles querem. Fez todo sentido que o pedido fosse em
Luanda e o casamento em Lisboa.
Rui
e Celma são de regiões diferentes. Rui é da parte Sul de Angola e Celma do
Norte, região bacongo. Para o noivo, era uma situação inédita, com muita
novidade à mistura. Os dias aproximavam-se e os nervos tomavam conta dele.
Houve necessidade de uma reunião, a fim de conhecer melhor todos os pormenores,
para que nada corresse mal. Como em todos os "pedidos", existe uma
conversa prévia com os familiares de ambos. Por norma, os tios mais velhos
servem de intermediários. É nesta altura que surge a carta do pedido.
A CARTA
A
carta é feita recorrendo a uma "carta modelo" vendida em Angola, na
qual se resumem as intenções do noivo. É com esta que se inicia o procedimento
da conversa em reunião. A carta deve ser envolvida num lenço branco e fechada
com um alfinete, registando assim a sua pureza. Geralmente, é feita e assinada
pelo representante ou o tio mais velho do noivo.
Rui
Ramos ressalta que, "no caso específico bacongo, é uma grande falta de
respeito ser assinada pelo noivo, porque não é o noivo que se dirige ao tio da
noiva, o representante é que tem que assinar a carta". Por falta de
"conhecimento ", já que ambos são de regiões diferentes de Angola, a
família do noivo procedeu de forma "errada". A carta em questão foi
assinada pelo noivo. Erros como este são considerados inadmissíveis para as
famílias bacongo e, quando tal acontece, é atribuída uma multa de valor
simbólico aos familiares.
Foi
pedida compreensão por parte dos meus familiares. Foi uma falha por falta de
conhecimento, eles entenderam, mas houve uma multa no valor de 35 €. A carta
foi aceite e corrigida na altura. Quando se aceita a carta já é um prenúncio
bastante positivo, desde que se cumpra com o resto, com o que está escrito na
carta.
A
carta é sempre acompanhada de uma lista de pedidos e de um valor monetário Jobe
José revela: "Foi algo muito
simples. Meti mil dólares na carta, já que não é estipulado um valor, depende
muito do valor que o homem dá pela noiva. É uma forma de agradecimento e respeito
pela família que a criou. Normalmente, esse dinheiro também é partilhado com os
tios pelos serviços prestados, já que servem de intermediários."
A
lista de pedidos (ou a factura) é uma exigência da família da noiva. Consiste
numa lista elaborada pelos tios, na qual consta uma relação de coisas que o
noivo deve comprar para a família da noiva. Entre os elementos fundamentais da
lista contam-se volumes de cigarros, caixas de fósforos, panos holandeses
(devido à sua qualidade), dinheiro, fatos, calçado e bebidas.
O ATO DE ALAMBAMENTO
São
estendidos panos africanos (panos do kongo) no local da cerimónia para a
receção do noivo, uma espécie de passadeira. Antes da sua entrada, são
depositados valores em dinheiro (geralmente notas) pela família do noivo.
Ao
entrar, o noivo é cercado pelas tias da noiva, que fazem um serviço de
preparação, como se de um rei se tratasse. Limpam-lhe os sapatos, arranjam-lhe
o fato, limpam-lhe o suor da testa e carregam-no ao colo (um ritual
especialmente desempenhado em famílias bacongo).
Já
na sala de reunião, do lado direito, a família do noivo; do lado esquerdo, a
família da noiva. Em frente e ao centro, numa espécie de altar, duas cadeiras
para os noivos. Inicia-se a cerimónia com base na carta do pedido.
O
moderador da família da noiva inicia a cerimónia, apresentando todos os
familiares que o acompanham. De seguida, dá a palavra ao orador da parte do
jovem, que também procede à apresentação de quem o acompanha.
Durante
todo este processo a noiva nunca está presente, só aparece se as famílias
chegarem a acordo. Estando todos de acordo, é analisada a lista para averiguar
se tudo o que foi pedido está correto. Tudo o que foi pedido deve ser envolvido
em panos africanos.
Posto
isto, passamos para o próximo passo: o local e data de casamento. Este momento
é caracterizado por pânico, ansiedade, não pode ser algo muito informal…",
explica Rui. É altura do noivo "exigir” a noiva. Mesmo neste momento,
ainda são "cobrados” alguns valores, como o transporte ou algum "agrado”
para a tia que traz a noiva. Quando esta aparece, vem toda envolta num pano.
Há
situações em que vêm duas ou mais raparigas para o noivo descobrir qual delas é
a futura esposa. Se errar, paga multa. Depois desse processo, os oradores dão
as bênçãos aos noivos e apresenta-se a aliança." Depois do protocolo de
cumprimentos, dá-se início à festa comemorativa.
A
realização da festa varia de região para região mas, apesar de diferentes,
formam um só costume. A crença faz com que grande parte do povo angolano
prossiga com a tradição, apesar de algumas mudanças. Melo Mendes explica que
"é muito raro casar sem alembamento. O casamento pode não durar, há casos
até mesmo de morte dos filhos, caso não se faça". Sendo assim, o povo
crente prefere não arriscar e cumpre a tradição. Até mesmo quando não se
prossegue com o casamento, optam pela devolução dos bens pedidos em
alembamento.
A
sociedade angolana (e, em especial, Comunicação.
Em
Moçambique é lobolo. Em Angola, é alambamento Fui a Chókwe, no interior da
província de Gaza, para acompanhar um lobolo tradicional. Aqui na cidade,
resume-se à entrega de dinheiro e ao pagamento da comida da festa. “Perdeu-se
muito do sentido”, diz o André, que nos acompanhou na visita. Também farei uma
versão para a TV Brasil. Por enquanto, saiba o que é um lobolo ou um
alambamento – tradicionalíssimo, lendo a reportagem da Agência Brasil. Em
Angola, o ritual chama-se alambamento. Ele é o tema deste comercial aqui
embaixo que você vai entender melhor se assistir depois de ler o texto.
Eduardo Castro
Correspondente
da EBC para a África Chókwe (Moçambique) – O novo código que regula as relação
familiares em Angola deve incorporar, pela primeira vez, uma regulamentação
para o casamento tradicional africano, chamado pelos angolanos de alambamento.
Em entrevista ao Jornal de Angola, a diretora da Família e Promoção da Mulher
no Huambo, Maria do Rosário Amadeu, afirmou que o fato de o alambamento não ser
reconhecido juridicamente tem causado muitos transtornos à sociedade. Segundo
ela, a nova legislação também deve levar em conta os casos de mulheres que têm
filhos com homens casados que se recusam a reconhecer as crianças.
No
alambamento não há certidões, assinaturas e nem rituais religiosos para
consagrar o casamento. O homem presenteia os pais da mulher com base em um rol
de pedidos, elaborado para confirmar seu interesse em fazer parte da família.
Tradicionalmente, quando essas condições são aceitas, a mulher passa a ser
tratada pela sociedade como esposa, mesmo que, do ponto de vista formal, não haja
casamento. Essa espécie de aprovação familiar é levada a sério em muitos países
africanos.
Em
Moçambique, a prática é muito parecida e recebe o nome de lobolo. O casamento
propriamente dito, registrado em cartório (ou na conservatória, como se diz nos
países africanos lusófonos), é considerado menos importante sob ponto de vista
social, sobretudo nas pequenas comunidades no interior. Mas ele dá a proteção
jurídica à esposa e aos filhos que o alambamento e o lobolo não alcançam.
O
casamento tradicional pode ocorrer antes ou depois da união de fato do casal.
Entretanto, é comum às mulheres dizer que só se sentem seguras depois da
cerimônia tradicional. “Depois de 18 anos finalmente fui lobolada. Esperei
tanto por este momento. Estou muito feliz”, diz Milagrosa Sitóe, de 33 anos,
ainda vestida de branco, no quintal da casa dela, no vilarejo de Guijá,
província de Gaza, interior de Moçambique. Ao lado dela, o marido, Arlindo
Mulhoi, também não disfarçava a alegria. “Agora sou um mukonwana, genro de
verdade, afirmou.
Antes
de lobolar Milagrosa, Arlindo era apenas mukwaxi, palavra da língua xangana que
indica que o companheiro de uma mulher ainda não cumpriu totalmente sua
obrigação tradicional. O tempo que estão juntos (18 anos) e os quatro filhos
não fazem diferença. “Agora, sim, o sangue dos filhos pertence a ambos. Se o
homem não faz lobolo, não é genro legítimo. Enquanto não lobolou, os filhos não
são seus”, explicou Alexandre Sidomi, tio de Milagrosa, que acompanha o lobolo.
“Genro é aquele que lobolou a sua mulher. Aquele que não lobola e que tem
filhos, esses filhos não lhe pertencem, fazem parte só da família da noiva,
confirmou outro tio, Armenio Saia.
Quando
a mulher casada morre sem ser lobolada, o marido viúvo não pode sequer enterrar
o corpo. Antes precisa cumprir sua obrigação, sob pena de ser reprovado por
toda a comunidade. Os dois tios de Milagrosa aprovaram o lobolo da sobrinha.
Eles eram parte de uma espécie de “comissão de parentes” – a madoda – que
confere se os pedidos feitos para o noivo foram efetivamente atendidos. A
conferência é parte da cerimônia, que foi integralmente acompanhada pela
Agência Brasil.
O ritual do lobolo
A
tradição começou com um chá, servido para as visitas no pátio que serve de sala
de estar do casal. Arlindo estava sozinho; desde a véspera, Milagrosa havia ido
para a antiga casa onde morou e onde atualmente vivem suas irmãs solteiras e
algumas tias e primas. Tanto a mãe quanto o pai dela já morreram, mas os tios
se encarregaram de fazer os pedidos e Arlindo, de cumpri-los. O noivo mostrou
aos parentes quais foram as exigências da família de Milagrosa para o lobolo:
um terno com sapatos e camisa para o tio da noiva, capulanas, mukume e vemba
(tecidos floridos tradicionais) para as tias, 12 litros de vinho, quatro caixas
de refrigerante e cerveja, uma esteira de palha (a cama do casal), 8,5 mil
meticais (MT – moeda moçambicana) em dinheiro (cerca de R$ 400, equivalente a
3,5 salários mínimos moçambicanos), além de uma vaca, cujo preço na região fica
entre MT 8 mil e MT 12 mil, dependendo do peso e da idade do animal. Três
pequenos potes de rapé completavam o rol de solicitações.
Arlindo,
que é alfaiate no vilarejo, demorou quase dois anos para recolher tudo. Sem
ordenado fixo, estima que seus ganhos variem entre MT 3,5 mil e 4,5 mil por
mês. Queria ter feito antes. “Agora tenho como cumprir a tradição. É uma forma
de agradecer aos pais dela por tê-la guardado bem e me confiado sua filha”, diz
ele. Em um canto o quintal, Madalena, a segunda esposa de Arlindo, acompanha à
distância. Ela também não foi lobolada, mas terá de esperar sua vez.
A
primeira esposa deve ser lobolada antes. Arlindo tem dois filhos com Madalena,
que é mais jovem que Milagrosa. Não há limite para casamentos tradicionais. Um
homem pode ter tantas esposas quanto puder manter. Tradicionalmente, mulher que
é lobolada fica casada para sempre. Se o marido quiser outra esposa, costuma
levá-la junto. Nas cidades, a lei (que proíbe a poligamia) e as regras cristãs
da Igreja Católica – trazida pelos portugueses para Moçambique – e das
denominações evangélicas que cresceram muito nos últimos ano têm feito com que
a maioria dos homens tenha apenas uma mulher. Entretanto, o adultério é prática
comum. As campanhas anti-aids (a doença é muito disseminada no país) costumam
tratar do tema em peças publicitárias e até no material didático usado pelos
estudantes de escolas públicas.
Na
hora marcada, 9 da manhã, os parentes seguiram a pé até a casa da família da
noiva, carregando o lobolo, a vaca inclusive, e cantando pelas vias de terra.
Bem vestidos, recebem o carinho da vizinhança, que sempre se alegra em dia de
lobolo. O nkulunguana, grito de alegria, de influência árabe, é ouvido em todo
bairro. O noivo não acompanhou; só irá para a casa da noiva se tudo correr bem
e o lobolo for aceito.
Sempre
cantando, as famílias se encontraram na frente da casa de Milagrosa, que não
tem portão ou grade – apenas um portal de madeira simples, enfeitado com flores
para a ocasião. Um tronco na frente da passagem é retirado por uma das tias, em
meio à cantoria, para mostrar que a visita é bem aceita. Cerca de 100 parentes
se aglomeram no terreno. Estão com roupa de festa: mulheres de vestidos longos,
homens de camisa e paletó, mesmo com o calor de 30 graus Celsius. Ao lado,
jovens depenam galinhas que foram mortas ali mesmo, havia poucos minutos.
Rapazes retiram o couro de um cabrito pendurado em uma árvore – um dos três que
serão servidos para os convidados. Também há xima (tradicional purê de farinha
de milho), arroz e batata frita. Tudo cozido à lenha, em fogueiras montadas no
quintal.
A
madoda confere os itens longe dos convidados e dos noivos. Depois de um tempo,
se junta aos demais em uma roda no quintal. Senhoras com capulanas coloridas
sentam-se no chão, sobre esteiras de palha. Aos mais velhos são oferecidas
cadeiras. As mulheres cantam o tempo todo em xangana, a língua materna da
maioria. As letras recomendam paciência (tiyisela) e avisam à família visitante
que, apesar das exigências, eles querem paz (kurhula).
A
noiva sai de seu quarto acompanhada das irmãs. Apreensiva, ouve as
considerações dos parentes sobre o lobolo e o noivo. O ancião da vila (nduna)
passa a palavra a quem queira se manifestar. Ao fim de quase uma hora, é dado o
veredito da comunidade: o lobolo foi aceito. O noivo é, então, recebido com
festa. As tias e primas trazem os presentes da noiva: colheres de pau, tachos
de madeira, uma enxada, capulanas coloridas. E também um galão de plástico,
para buscar água para casa na única fonte do lugar. Começa o almoço, que se estenderá
até o fim da tarde, quando o sol for embora. Sem a interferência de um juiz de
paz ou de qualquer líder religioso, Arlindo, Milagrosa e os quatro filhos
passam agora a ser, pelas regras tradicionais africanas, uma família.
O
alambamento na tradição Bakongo Etiquetas: Usos e costumes da Damba Estudos de
casos de alembamentos realizados em famílias oriundas da Damba e de Maquela do
Zombo fixadas em Luanda a partir de 1980, O presente artigo, que tem como tema
o Alembamento na Tradição Bakongo, é resultado de um estudo sociológico
realizado ao longo de um ano que serviu como tema de dissertação de fim de
curso na área de Sociologia na Faculdade de Letras e Ciências Sociais.
Pretendemos
com esta publicação, primeiramente, levar ao conhecimento do leitor determinados
aspectos reais ligados a este ritual que não é exclusivo dos Bakongo, mas que é
também praticado, de uma maneira ou de outra, por todos povos de Angola bem
como em toda região Bantu (como nos explica Pe. ALTUNA). De seguida queremos
com isso despertar a sociedade angolana fazendo-a recordar-se de uma das muitas
raízes culturais que existem neste país. Em terceiro lugar, analisar as
possíveis influências de factores como o passar do “tempo” e a mudança de
“espaço” (localização geográfica) neste ritual.
Como
se sabe, nenhuma sociedade se encontra desprovida de hábitos, de usos e
costumes, de conhecimentos, ritos e tradições que lhes são peculiares. Por essa
razão, estes elementos culturais que variam no tempo e no espaço exercem
profundas influências sobre os indivíduos e regulam não só os modos de união
conjugal, mas também os requisitos e as normas de casamento (indissociáveis dos
saberes e/ou dos mitos que fazem parte da vida de cada povo). Por exemplo, em
algumas sociedades (como em muitos países ocidentais), o acto de oferecer um
anel com uma pedra de brilhante significa as intenções matrimoniais de quem faz
a dádiva (prática que também já vem sendo utilizada em substituição do
alembamento por algumas famílias angolanas). Já noutras sociedades (como
acontece em muitas regiões da África) as intenções matrimoniais não consistem
meramente na oferta de um anel, pelo contrário, prescrevem uma série de
requisitos materiais e simbólicos “que estão ligados aos saberes dos indivíduos
e grupos” daquela sociedade.
Por
isso, neste grupo e em quase toda África, como afirma RadcliffeBrown “um
casamento engloba o pagamento de uma prestação do noivo ou pelos seus parentes
ao pai ou ao representante da noiva” [Radcliffe-Brown & Forde 1982: 66],
pois o pagamento da prestação em bens (dados pelo noivo aos parentes da noiva)
constitui a parte essencial para o estabelecimento da legalidade do matrimónio.
Em Angola, devido à diversidade cultural, cada comunidade ou grupo
etnolinguístico possui as suas próprias estratégias matrimoniais. E mesmo entre
povos do mesmo grupo podemos encontrar algumas diferenças, por isso, nos
apegámos apenas a dois municípios da província do Uige: Damba e Maquela do
Zombo, sem esquecer de mencionar os estudos que foram feitos junto dos Bakongo
provenientes destas áreas que vivem em Luanda há mais de vinte anos.
O
alembamento pode ser entendido como uma forma tradicional de união conjugal
existente nalgumas regiões de África, principalmente entre os povos Bantu. Este
refere-se a um conjunto de preparativos e entregas que a família do noivo faz à
da noiva, com o intento de legitimar o casamento e estabelecer novos laços de
parentesco (também chamados laços de afinidade ou aliança). Consiste na entrega
de certas quantias em dinheiro, roupas, calçados, bebidas, animais e
determinados objectos, Porquê o alembamento na tradição Bakongo
A
escolha deste tema devese principalmente por duas razões. Primeiro, pela
vontade de compreender este ritual que para muitos parece ser estranho, até
mesmo os jovens descendestes do grupo Bakongo. Em segundo, porque é um tema que
suscita muitas dúvidas
e
levanta muitos debates por parte daquelas pessoas que só ouvem falar ou
daquelas que presenciaram, mas por alguma razão o não entenderam correctamente.
Por meio de algumas entrevistas, os mais velhos nos contaram que o alembamento
começou há muitos e muitos anos, antes da chegada dos colonizadores, alguns
mais ousados atrevem-se a dizer que este ritual existiu desde sempre. Disseram
ainda que surgiu da necessidade de se valorizar a mulher por ser ela a
procriadora dos filhos, e a sua família que a educa até que esta sáia de casa
para ir viver com o seu marido.
Um
mais velho natural do Kibokolo (Maquela do Zombo) de 75 anos de idade, conta
que na sua época não eram os jovens quem escolhiam as noivas, mas sim a sua
família. Assim, o pai de um rapaz escolhia uma jovem de boa família para ser
mulher do seu filho e segundo os parentes de ambos, o pai do rapaz levava um
garrafão de maruvo ao pai da rapariga dizendo: “eu venho entregar este garrafão
de maruvo, para terem conhecimento de que a vossa filha será a futura mulher do
meu filho e mais ninguém pode ocupá-la. O alembamento era feito por meio da
entrega de alguns garrafões de maruvo, de outras bebidas caseiras e mais alguns
artigos simbólicos.
Com
a chegada dos portugueses, com o colonialismo, a urbanização e a mistura de
diversas culturas (quer dos portugueses como as que já existiam) as coisas
começaram a mudar de rumo.
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este post Alambamento hoje em dia, cultura ou extorsão e oportunismo Até pouco
depois dos anos 80, o pedido ou alambamento consistia apenas em pedir a mão da namorada
à família, mais propriamente ao tio, que tem um papel fundamental para que o
casamento de concretize. Pedia-se geralmente uma muda de pano para a mãe ou tia
da rapariga, um garrafão de vinho para os pais e os tios e alguns valores na
carta do pedido. Nos dias de hoje, o alambamento é uma “fortuna”. Algumas
famílias exigem ao noivo valores exorbitantes. O alambamento é um ritual
praticado em dois terços dos países africanos e alguns asiáticos, em que na
maior parte dos países, é mais importante que o casamento civil ou religioso.
E
como se formou a palavra alambamento entre os angolanos Alambamento é um
neologismo que os angolanos criaram para preencher a lacuna verificada na
língua portuguesa para designar ovilombo (pedido de casamento) em umbundu;
ovilombo vem do verbo umbundu okulomba (pedir).
Há quem refira ainda que alambamento vem da palavra umbundu okulemba
(alegrar para consolar), por isso alguns pronunciam alembamento em vez de
alambamento, porque a retirada da filha para o seu novo lar pode causar alguma
tristeza aos pais, e há que consolá-los (com um presente) explicam assim,
alguns filólogos a etimologia da palavra alambamento.
Mas,
acima de tudo, o alambamento é visto pelos africanos como um prémio à noiva
pelo seu bom comportamento pessoal e pelo de seus pais que a criaram, porque
não é muito fácil educar uma filha em virtudes, dadas as muitas tentações na
vida que a espreitam. O bom comportamento dela pressupõe o bom comportamento
dos seus pais, pelo que todos devem ser premiados: a filha e os seus pais! Esse
prémio é que é o alambamento.
COMO ACONTECE O ALAMBAMENTO
Quando
o jovem casal de namorados decide casar, é necessário ter a autorização da
família da noiva e isso só é possível se, durante o pedido, toda a gente
estiver de acordo em que o casamento se concretize. O jovem casal solicita o
dia do pedido, mas a data é marcada pelos tios da noiva, pois é necessário
reunir toda a família. É entregue uma lista contendo o que o noivo tem de
conseguir reunir até ao dia do pedido. Depois da marcação do dia do alambamento
o noivo parte em busca de todo o material para que no dia não falte nada.
Quando
chega o dia, a família do noivo vai a casa da noiva e o tio da mesma, como se
de um juiz se tratasse, apresenta todos e informa de que se vai dar início ao
pedido de casamento. O tio dá início à leitura do pedido apresentado pelo
noivo. Se o pai da noiva concordar com o pedido, o noivo terá de ir buscar o
alambamento, ou seja, aquela lista de coisas que reuniu. O alambamento é
apresentado e se tudo for cumprido é feita uma reunião para acertar a data do
casamento e outros detalhes de natureza logística. Posto isto tudo, canta-se e
dança-se. A partir deste dia, se tudo correr bem, o casal de namorados passam a
ser marido e mulher.
Há
casos em que o noivo é colocado diante de três mulheres totalmente forradas de
panos para descobrir quem é a sua mulher, se errar vai pagando valor monetários
ate que acerte. O alambamento não é mais do que o pagamento da mão da noiva. O
papel dos tios é tanto ou mais importante do que o dos pais, pois os tios são
também responsáveis pela educação da noiva. Actualmente esta tradição está em
declínio, mas ainda há famílias conservadoras que fazem cumprir a tradição e
não cedem a mão da filha sem que seja tudo cumprido à risca. Há também aquelas
que se aproveitam do ritual para tirar vantagem e fazer exigências
imperceptíveis pela mão de sua filha. Há cartas de pedidos que exigem gerador,
pacote de parabólica televisiva, terrenos com medidas exactas, motas e outros
itens absurdos que fazem do ritual um vandalismo.
A
nossa tradição é a nossa identidade. É ela que nos define, por isso deve ser
cumprida inquestionavelmente e passada de geração em geração. Só não vale usar
este facto como argumento para fazer exigências exorbitantes e no fim de tudo o
ritual perder o seu real significado e valor.
Post
Pagin O alambamento: casamento tradicional nalgumas culturas de Angola O
alambamento Pretendemos, com o presente trabalho, falar sobre o alambamento,
apresentar a sua etimologia, seu conceito, bem como destacar algumas marcas que
o fazem distinguir do casamento “convencional”, aspectos exigidos para que haja
um alambamento, comparações entre o alambamento realizado no passado e o que se
verifica actualmente.
O alambamento
Etimologia
A
esse respeito, parece não haver consenso entre diversos estudiosos quanto à
origem do lexema “alambamento”. Vamos, abaixo, apresentar estas controvérsias, Segundo Barroso e Cunha (s.d., p. 1), o alambamento
tem origem na língua kimbundu e, mais tarde, foi aportuguesado para
“alembamento. De acordo com Mbambi (2014, p. 2), «o alambamento é um neologismo
criado pelos angolanos para preencher a lacuna verificada na língua portuguesa
para designar ovilombo (pedido de casamento) em umbundu. Segundo ainda ele, «o
termo ovilombo surge do verbo okulombaque que significa pedir em português.
O
primeiro, como vimos, diz-nos que o lexema alambamento surgiu na língua
kimbundu, mas o segundo sugere que se trata de um lexema novo criado pelos
angolanos para colmatar o vazio deixado pela lexicologia portuguesa, pelo
simples facto de não possuir um lexema que reflectisse aquela realidade
cultural. As versões sobre o alambamento são várias. Uns, vêem-no como um
casamento tradicional; outros, porém, chegam a vê-lo como um pedido para a
ligação matrimonial, tal como nos diz Santos (2017, p. 8):
Outra
questão a ser evidenciada refere-se à diversidade de versões sobre que consiste
associação do termo alambamento. Há indícios que em determinada época o termo
alambamento referiu-se à cerimônia de casamento, tendo assim reconhecimento
e legitimidade social. Em outras
versões, refere-se apenas ao pedido para o enlace matrimonial, o que não atesta
aos nubentes os direitos sociais e legais enquanto esposo e esposa. A esse
respeito, Mbambe conscientiza-nos de que «uma portaria do então Governo-Geral
da República de Angola, de 22 de Dezembro de 1948, caracterizou o alambamento
como prova do casamento.
Conceitos do alambamento
Para
os primeiros autores referenciados acima, o alambamento «consiste num conjunto
de mercadorias e de presentes que o noivo dá por contrato, sendo visto como
símbolo de casamento, prêmio aos familiares da nubente como indenização pelos
gastos feitos com ela desde o seu nascimento até ao dia do casamento, uma vez
que foi essa família que a gestou e criou. Para o livro didáctico de Língua
Portuguesa da 8.ª classe (2008, p.
54), o alambamento é o «conjunto de
preparativos e entregas que preparam e legitimam o casamento. Uma família junta
a qualidade de bens necessários para que um membro seu receba uma mulher de
outro grupo, que enriquecerá o grupo com os filhos e o trabalho agrícola; a
outra família condivide os bens
necessários».
Santos
(2017, p. 11) define o alambamento como sendo «um conjunto de preparativos e
entregas que a família do noivo faz a
parentesco. Consiste na entrega de quantias em dinheiro, roupas, calçados,
bebidas, animais e determinados objetos, que são comumente solicitados pelas
tias da noiva».
A
nosso ver, o alambamento consiste numa espécie de casamento tradicional, no qual uma família reúne os bens necessários
exigidos por outra (família), para que,
entretanto, possa receber em troca um membro de uma outra família, no caso de
uma mulher. Tal como o ocidente tem o seu casamento, na cultura bantu o
alambamento assemelha-se ao casamento convencional, aquele que acontece na
igreja e na conservatória, o que o torna mais importante em relação ao
casamento formal. Em muitas etnias bantu, o alambambento ou casamento
tradicional é o mais importante, pois concede ao marido a categoria de genro. É
com o alambambento que se adquire os poderes de marido sobre uma mulher e de
pai sobre os filhos, os quais por sua vez são criados dentro da moral cívica das
suas culturas (Santos, 2017, p. 12).
Há, em relação a isso, alguns aspectos
característicos do casamento bantu que, no entanto, o faz distinguir-se do
casamento ocidental, como é o caso da «carta de pedido», na qual se faz
presente os requisitos indispensáveis a serem dados por uma família, no caso a
do homem, para que então a cerimónia
aconteça. Segundo ainda Santos (2017, p. 12), referindo-se ao
alambamento na perspectiva bakongo, diz-nos que «um casamento só se realiza com
o acordo dos pais, principalmente do chefe do clã ou família materno chamado
Nkulubundu e dificilmente se trata com os noivos, mas sim com os mais velhos
destes com a presença das testemunhas chamadas Ntetembua, representados pelos sábios e aciãos da
comunidade».
Para
Santos (idem), a carta de pedido, muitas vezes elaborada pelos pais ou tios da
noiva, consiste em uma lista de pedidos de bebidas e objectos simbólicos para
aquele grupo social. O cumprimento e entrega desses elementos representa a
firmação desse compromisso perante a sociedade, a qual presencia como forma de
testemunho ocular do contrato social.
É
nesta perspectiva que Barroso e Cunha (s.d., para. 1) vão dizer que o
alambamento «passou a considerar-se como garantia do contrato de
casamento, ou como caução impeditiva da sua rescisão. É tido como
caução impeditiva porque em caso de divórcio a família da noiva é obrigada a
devolver os bens recebidos.
Se
olharmos para a componente sociocultural, veremos que há, deveras, razões
suficientes para que tenhamos nas nossas sociedades algo do género, pois
permite uma ligação, por exemplo, entre grupos étnicos diferentes, aos quais se
vão interagindo e, consequentemente, partilhar os hábitos e custumes que se
lhes são peculiares, fazendo com que uma família conheça as particularidades
culturais da outra, e assim vice-versa, uma vez que, segundo Mbambi, o
alembamento se constitui numa cerimônia muito ritualizada, sendo o primeiro
encontro formal da família do noivo e da noiva, onde são entregues os
presentes, e apresentados os noivos às duas famílias».
Reforçando
o que acima dissemos, Barroso e Cunha (s.d., para 2) asseguram-nos que: Essa
cerimônia é de grande importância cultural em Angola, pela própria manutenção
dos hábitos e costumes que identificam determinado povo, bem como pela
valorização da mulher e da família que a criou, uma vez que o alembamento se
traduz num estímulo às virtudes no seio das famílias angolanas, estando em jogo
não apenas a formação de uma nova família, mas acima de tudo o estabelecimento
de uma aliança pública entre as duas famílias.
Embora
se registe uma «troca» de bens materiais e humano, para os bantu isso não equivale
à noção de «compra» e «venda», como muitas vezes se faz perceber. Este costume
aparece tão difundido que se especifica o casamento «negro-africano», tal como
«nenhum banto dá a entender que o alambamento seja uma compra mediante
pagamento. Se aparece esta cambiante ou se verifica esta triste realidade, é
devido a abusos ou à corrupção dos custumes. (Manual de Língua Portuguesa da
8.ª classe, 2008, p. 54)
Em
oposição ao que muito se afirma, Angola é, indubitavelmente, um conjunto de
muitas nações, e não somente de uma. Não a sendo, cada nação tem os seus
custumes e hábitos culturais que se lhes são próprios, dos quais algumas nações
se aproximam, e outras, porém, distanciam-se. Com isso, é nossa pretensão dizer que, tal como é a cultura, os bens que
se exigem para que um casamento tradicional ocorra variam de cultura a cultura,
relação cultural, aspectos socioeconómicos.
Sobre
os elementos culturais presentes na cerimônia de casamento ou alambamento,
identifica-se uma variação desses
elementos no tempo e no espaço. Todavia, tais variações não modificam sua
importância na sociedade uma vez que exercem profundas influências sobre os
indivíduos, assim como norteiam não só os modos de união conjugal, mas também
os requisitos, as normas e papéis sociais a serem cumpridos de acordo com os
saberes, valores, costumes que os identificam. (Santos, 2017, p. 8)
Valoriza-se,
no alambamento, a mulher bonita, que sabe fazer em condições os trabalhos
domésticos, tais como lavar, passar a ferro, cozinhar e, por último, que tenha
um grau de letramento considerável. Para uma mulher que reúne aqueles itens, é
possível que os bens exigidos possam ser avultados em relação àquela mulher que
não reúne, na totalidade, aquelas condições.
Normalmente,
os bens exigidos, isso a depender do grupo etnolinguístico, podem ser
constituídos de/por objectos, alimentos, vestuários, álcool, animais,
utensílios domésticos ou de agricultura, dinheiro, etc. De acordo com Barroso e
Cunha (s.d., para 2),
Nos
dias de hoje, os bens ofertados são constituídos basicamente por: dois panos, um para a mãe da
noiva e outro para a tia (trata-se da tia paterna); um terno completo (calça,
camisa, colete, gravata, paletó, sapato) para o pai da noiva, alguns engradados
de refrigerante e/ou cerveja (que variam de 7 a 14 engradados), dois lenços de
cabeça para cada uma das avós, um petromax (tipo de lamparina), um sobretudo
(chamado “casacão”) para o tio materno, Podem ainda ser ofertados uma garrafa
de maruvo (vinho de palma), vinho comum, galinhas, noz cola3, algumas garrafas
de whisky e perfume para a mãe da noiva. É entregue ainda uma soma em dinheiro
que é definida em função do estatuto social, das famílias dentro da
comunidade. A lista dos bens é entregue
aos emissários, que a fazem chegar aos restantes membros da família, sendo
esses bens levados na altura da cerimônia, se salientado que o não cumprimento
pode acarretar no rompimento do acordo firmado.
Em
relação ao que se regista hodiernamente, parece haver, nas sociedades modernas
angolanas, um exagero de requisitos em comparação ao que no passado se exigia.
Com o passar do tempo, algumas culturas passaram a exigir mais do que nas
épocas pretéritas e, com isso, alguns vêem veem a mulher como uma «mercadoria»
que deve ser comprada. Todavia, segundo o livro didáctico de Língua Portuguesa
da 8.ª classe (2008, p. 55), «O alembamento, segundo o seu significado
original, converte-se no mais comum instrumento de aliança e amizade entre os
grupos sociais bantos. Torna-os solidários, já que estreita laços físicos e
espirituais.
No
fundo, o que se pretende com o alambamento é, deveras, o estreitamento dos
laços familiares, união familiar, a extensão do grupo, etc.
Conclusão
Consoante
o que foi aqui apresentado, chegámos a concluir que, do ponto de vista etimológico,
há uma controvérsia no que diz respeito à origem do lexema alambamento: há
evidências de que tal lexema tenha origem em kimbundu e em umbundu, mas há
ainda autores que acreditam que «alembamento» em vez de «alambamento» é um caso
de aportuguesamento da variante kimbundu «alambamento».
Sobre
a sua concepção e utilidade sociocultural, entendemos que se trata de um
encontro entre duas famílias, cujo objectivo principal é o de unir e estreitar
os laços familiares, bem como juntar dois grupos etnolinguísticos diferentes.
Ainda assim, o vimos como sendo uma prática sociocultural angolana em que se
regista uma entrega de bens exigidos por parte da família da noiva, a fim de
receber, como «troca», um membro de uma outra família. Os bens e os rituais,
entretanto, variam de região a região.
Em
relação ao tempo, concluímos que nos actos actuais se verificam um certo
exagero no que diz respeito aos bens pedidos por parte da família da noiva. Em
certas regiões, vê-se o alambamento como sendo um acto simbólico em que quase
nada de material se pede. Noutras, ao contrário, sem a reunião necessária dos
bens exigidos, o alambamento, uma aliança sociocultural, não ocorre.
Alambamento
O
antropólogo Afonso Teca disse:
Por João Carlos Carranca - Junho
22, 2010
Até
aos anos 80,o alembamento resumia-se a uma celebração para as famílias dos
futuros casais e as coisas impostas pela família da noiva resumiam-se a uma
pequena “cesta básica”. Uma muda de pano para a mãe ou tia da rapariga, um
garrafão de vinho para os pais e os tios. Mas no Norte de Angola, o alembamento
sempre teve um dote mais pesado.
Nos
dias de hoje, o alembamento é uma “fortuna”. Algumas famílias exigem ao noivo
valores exorbitantes. Zambrotta dos Santos sabia de antemão que tinha de pagar
uma multa, pelo facto da rapariga com quem pretendia casar se encontrar
grávida: “como namorámos dez anos, achei que a multa não seria exigida”, disse,
considerando-se felizardo pelo facto da família da mulher não ter feito grandes
exigências no alembamento: “foi uma cerimónia informal, porque as famílias já
se conheciam. Mas como eu engravidei a moça antes do pedido e na região do pai
dela se exigia este ritual, então só tive de cumprir o que já estava
estabelecido para não quebrar as regras”, explicou.
O
alembamento é a oficialização do casamento tradicional entre duas pessoas. O
antropólogo Afonso Teca disse que a sua concretização só é possível depois da
resposta dos familiares da noiva, após uma carta do rapaz. A carta, por
exemplo, na região da Damba, província do Uíge, deve fazer-se acompanhar de uma
garrafa de whisky e 250 dólares. O whisky é uma bebida importada e o dólar uma
moeda estrangeira, mas há quem chame a isto “tradicional”.
Afonso
Teca diz que “só depois da resposta é que o rapaz e a família se apresentam em
casa da moça com os bens exigidos para a realização do acto”, disse.
O
dote também pode incluir um garrafão de maruvu, cola Na Damba são exigidos 450
a 500 dólares para o dote, dois fatos, duas peças de pano do Congo, dois
garrafões de vinho, dez grades de cerveja (importada) igual número de grades de
gasosas, dois pares de sapatos, dois pares de chinelas, duas garrafas de
whisky. Tudo muito tradicional.
e
gengibre, duas galinhas, um petromax e dois lenços de cabeça e de bolso. Este
alembamento pode também variar de família para família. Neste caso particular
as galinhas simbolizam a fertilidade da mulher.
Na
região de Sanza Pombo, província do Uíge, na lista podem constar caixas de
fósforos, armas de caça, porcos, cabritos e outros bens. Neste município, diz o
antropólogo, as famílias são mais exigentes.
Exagero na cerveja
Algumas
famílias muitas das vezes exageram na formalização da lista dos bens para o
alembamento. Afonso Teca disse que muitas famílias optaram em juntar os
costumes da região da rapariga ou do rapaz, o que torna a lista maior.
“Recentemente acompanhei um pedido em que ao rapaz foram exigidas 30 grades de
cerveja. Isso é um exagero”. Esta família, argumentou o rapaz, é Bakongo e na
sua região as exigências são mais pesadas do que noutras zonas: “neste caso
particular, a família da moça juntou o essencial da sua cultura e adicionou
alguns bens da cultura do homem. Isso nunca aconteceu em localidade nenhum”,
afirmou.
Quanto
ao dote, cada família estipula o que lhe interessa: “existem famílias que
chegam a pedir mil dólares e o valor pode estar relacionado com as qualidades
da noiva”. Este negócio das listas faz pensar que os pais estão a vender a
filha. Mas Afonso Teca descansa os mais preocupados com o negócio: “o
alembamento é uma simbologia que exprime respeito e admiração e quando o homem
não oficializa a sua relação com o alembamento nem sempre a mulher é respeitada
dentro de sua casa”.
Afonso
Teca revela uma boa notícia: “Hoje muitas famílias já não pedem nada ao moço, o
que não quer dizer que o rapaz perca admiração diante da família da mulher”.
O dólar na carta
A
exigência do dólar na carta do alembamento deve-se à desvalorização da moeda
nacional, que pelos vistos prejudica a tradição. O antropólogo Afonso Teca
disse que em muitos pedidos, nem sempre o rapaz paga o dote por completo para
permitir que a família da rapariga se desloque à casa do rapaz para analisar as
condições sociais em que vive a sua filha.
Dado
o tempo que pode levar até à gravidez, se a moeda for o kwanza pode nessa
altura ser um valor baixo. Daí a opção pelo dólar, que até à era Mardoff tinha
sempre muito valor. “Tradicionalmente o dote não era pago por completo, isto
para permitir que a família da moça se deslocasse à casa do rapaz e visse as
condições em que a filha vivia e a recepção que lhe era oferecida”, disse.
Afonso Teca afirmou ainda que os bens exigidos ao noivo são “símbolos
culturais”.
Alembamento em Luanda
Na
província de Luanda o pedido depende exclusivamente da rapariga. Para a
composição da lista ela também participa na discussão da família. Francisca
Pinha tem 69 anos, é natural de Luanda e contou ao Jornal de Angola, que a
tradição de Luanda é mais simples do que nas outras províncias.
Francisca
Pinha conta que antigamente apesar do pedido ser um acto de valorização da
mulher, muitas famílias acabavam por rejeitar o acto. “Havia homens que
desrespeitavam e batiam na mulher. E quando a mulher reivindicava ele obrigava
os pais da moça a devolver as coisas”, disse.
Esta
situação fez com que muitas famílias deixassem de realizar o acto de pedido com
bens: “na minha família durante muito tempo nós não realizávamos pedido devido
a estes abusos”, explicou.
Na
tradição de Luanda, ao homem são exigidos três pares de panos, dez grades de
cerveja e gasosa, um garrafão de vinho, um fato para o pai da moça, um par de
sapatos, uma camisa branca com gravata, whisky, amarula, aguardente, martini,
chinelas ou sandálias para a mãe, dois lenços, o anel de noivado e um dote no
valor de 500 dólares.
Francisca
Pinha disse que a não realização do pedido nunca representou maldição para o
casal, uma vez que o acto em si depende exclusivamente do futuro casal. “Embora
seja tradição, se os jovens não quiserem não podem ser obrigados, nós desejamos
a felicidade dos nossos filhos”, concluiu
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