O PAPEL DO MAGISTRADO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NO EXERCÍCIO DA JUSTIÇA


TRABALHO ELABORADO POR FLUSIL MOMENT





INSTITUTO SUPERIOR TÉCNICO DE ANGOLA- ISTA
CENTRO ACADEMICO DE CAXITO
COORDENAÇÃO DO CURSO DE DIREITO







O PAPEL DO MAGISTRADO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NO EXERCÍCIO DA JUSTIÇA



IVº ANO DE DIREITO
SALA: n.º 08
PERÍODO: PÓS LABORAL







Caxito, Maio
2018

INSTITUTO SUPERIOR TÉCNICO DE ANGOLA- ISTA
COORDENAÇÃO DO CURSO DE DIREITO




Autor (a):
FREDINELO JOSÉ LEÃO NICOLAU







O PAPEL DO MAGISTRADO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NO EXERCÍCIO DA JUSTIÇA



Trabalho de pesquisa científica apresentado a Professora Dra. ARMINDACOSME como requisito de avaliação da disciplina de Ética e Deontologia Jurídica.









Caxito, Maio

2018






INTRODUÇÃO
O Ministério Público (por sua vez chamado também de Procuradoria Geral, Ministério Fiscal e Promotoria Geral), é um organismo público, geralmente estatal, ao que se atribui, dentro de um Estado de Direito Democrático, a representação dos interesses da sociedade mediante o exercício das faculdades de direcção da investigação dos factos que revestem os caracteres de delito, de protecção às vítimas e testemunhas, e de titularidade e sustento da acção penal pública.
Da mesma forma, está encarregado de contribuir para o estabelecimento dos critérios da política criminal ou da persecução penal dentro do Estado, à luz dos princípios orientadores do Direito penal moderno (como o de mínima intervenção e de selectividade).
Por sua qualidade no procedimento e sua vinculação com os demais intervenientes no processo penal, é uma posição oposta ao imputado e exercer a acção penal (em alguns países em forma monopólica). No entanto, é parte formal e não material, por carecer de interesse parcial (como um simples particular) e por possuir uma parcialidade que encarna à colectividade (ao Estado) e que exige, para tanto, que seja um fiel reflexo da máxima probidade e virtude cívica no exercício de suas atribuições e no cumprimento de seus deveres.
Em vários países, entre os quais Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné- Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor- Leste, o Ministério Público é comandado pela Procuradoria- Geral da República.
O Ministério Público, em geral, configura-se como um órgão sem personalidade nem património próprio. Logo, atua sob a personalidade jurídica do Estado. Entretanto, isso não significa que careça de autonomia e independência funcional, administrativa e financeira.












MINISTÉRIO PÚBLICO
O conceito de Ministério Público há-de resultar da comparação do art.º 186.º da Constituição da República Angolana, e do art.º 219.º da Constituição da República Portuguesa, bem como dos respetivos Estatuto e lei orgânica do Ministério Público. Podendo-se, assim, definir como o órgão do Estado ao qual compete representar o estado e defender os interesses que a lei determinar, participar na execução da política criminal definida pelos órgãos de soberania, exercer a ação penal e defender a legalidade democrática. Em Angola, a Lei Orgânica da Procuradoria- Geral da República e do Ministério Público no seu art.º 7.º, n.º 1, determina que são órgãos da Procuradoria-Geral da República: o Ministério Público, o Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público e a Procuradoria Militar.
EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO MINISTÉRIO PÚBLICO
Como afirma GERMANO M. DA SILVA, “é ainda hoje controversa a questão das origens do Ministério Público. Alguns autores situam-na na antiguidade Romana, outros na Idade Média. Segundo o autor, pela estrutura e funções parece que a sua origem tem como base a legislação emergente da Revolução Francesa”.
Estabelece INÊS SEABRA, “as origens do Ministério Público têm conforme os autores, uma localização muito diversa. Segundo a autora, é no direito Romano que alguns fazem notar o nascimento do Ministério Público, revelando o conjunto das atribuições dos Censores, vigilantes gerais da moralidade Romana, investigando o vício para punir; os Defensores dasCidades, criados para prevenir os crimes, denunciando ao imperador a conduta dos funcionários e fazê-los comparecerem em tribunal; os Irenarcas, oficiais de polícia, a quem competia o exercício da vigilância e a correspetiva denúncia às autoridades superiores; os Presidentes dasQuestões Perpétuas, cujo elemento etimológico aponta para a investigação e recolha de provas; e, por fim os Promotores dos Césares, encarregados de gerir os bens dominais”.
Outros defendem encontrar-se no direito Romano as origens do Ministério Público, e localizam-na nos ProcuratoresCaesaris, estabelecidos no tempo do imperador Augusto, tempo no qual os imperadores passaram a confiscar os bens de cidadãos condenados. Porém, lhes era atribuída a competência de receber os impostos, fiscalizar e administrar os bens e interesses patrimoniais do imperador. Porquanto, embora no âmbito funcional de cada um destes oficiais Romanos, se possa encontrar algumas tarefas passíveis de identificação em termos amplos, com as de um Ministério Público, o que se aponta, em contrapartida, é a ausência de um carácter próprio ou organizacional definida.
O que se constata aqui (e se aplica de igual forma à, observação da realidade Grega) é que as diversas funções estavam distribuídas por diversos indivíduos, sem a uniformidade ou coerência de um sistema”. “Há também quem defenda, desta feita já na frança de Carlos Magno o saio, oficial com atribuições essencialmente fiscais, de execução dos devedores de impostos, que atuavam em cada catão, junto de cada tribunal”. Sublinha a autora, “só a realidade conhecida e permitida pelas condições políticas de centralização do poder no Monarca, a partir do século XIV, essencialmente em França, merece o acordo generalizado quanto a ser possível falar, realmente, do aparecimento do Ministério Público”. “É precisamente ao aparecimento de uma estrutura organizada, com regulamentação estável que se reporta a referência ao século XIV em França, na figura dos Procuradores do Rei, órgãos já investidos do exercício da acusação penal, em representação do Monarca, ainda que sem os traços de unidade e uniformidade de direção supervenientes. Porém, a centralização do poder corresponde assim também a consolidação do Mistério Público, ao mesmo tempo que à função primitiva (fiscal) se junta a acusação penal dos criminosos”.
É unanimemente reconhecido, por influência da Revolução Francesa, de 1799 e a consagração da separação de poderes, que ao projetar-se no modelo da maior parte dos Países Europeus. Será no entanto só bastantes anos avançados da Revolução que ele adquire organização definitiva, até aí, embora criada a figura do Comissário do Rei, nomeado pelo Rei, inamovível e vitalício, ela tem apenas por missão Vigiar a Aplicação das Leis e a Execução das Decisões Judiciais; o Exercício da Acusação é realizado por um Acusador Público, eleito pelo Povo, naquilo que no entendimento de alguns autores sublinham ser uma manifestação da desconfiança contra o poder judicial, pelo suporte que representara no ancien regime. Consequentemente, este acusador público viria a ser extinto em 1799 e as suas funções junto dos Tribunais Criminais adstritas ao Comissário do Governo, a quem, em 1810, é expressa e definitivamente atribuída a função de Representante do Executivo junto da Autoridade Judiciária.
O Ministério Público Francês configura-se como um autêntico produto de exportação daquele País, marcando a modelação de tipo Napoleónico do Ministério Público Francês, ao menos num primeiro momento a estruturação desta figura na maior parte dos Países da Europa. Daí e ainda com diferenças, na Alemanha, Bélgica e Espanha, por exemplo se venha a encontrar uma nítida dependência do Governo, consubstanciada em poderes diretivos, entendidos como consequência da respetiva vinculação hierárquica, poderes disciplinares e de recrutamento. Embora se encontre como caraterística comum uma vinculação ao executivo, no entanto ela apresenta intensidades consideravelmente diferentes, não invalidando a sua localização ambivalente, em alguns casos, no seio dos tribunais, ou mesmo do Poder Judicial.
 “Caso paradigmático, de evolução num sentido completamente diferente é o Italiano, cujo passo fundamental foi dado pela Constituição de 1948, de uma magistratura única, apenas distinguível pela suas funções, na qual as diferenças entre Judicatura e Ministério Público, reguladas organicamente pelo mesmo Estatuto e Conselho Superior da Magistratura, pouco mais se traduzem do que na relação de hierarquia dos últimos”.
Quanto à sua posição institucional, o Ministério Público pode encontrar-se:
1.      Inserido dentro do poder executivo, em cujo caso o presidente ou chefe de governo tem faculdade decisivas em sua condução, intervindo na nomeação e destituição de suas autoridades e demais membros (como sucede no sistema mexicano, francês, alemão e estadunidense).
2.      Incorporado no poder judiciário, caso no qual poderia ficar condicionado à função jurisdicional (como sucede em Colômbia a partir da mudança constitucional de 1991).
3.      Inserido no poder legislativo, podendo ficar o exercício de sua função influída pela contingência politica.
4.      Independente dos poderes do Estado, entendendo-se como um órgão que não responde ante nenhum dos poderes clássicos em qualidade de subordinado hierarquicamente (como sucede no sistema brasileiro, peruano, chileno e guatemalteco).
5.      Como um poder do Estado por si mesmo, se entendendo como um órgão autónomo, consagrado constitucionalmente e em igualdade de condições aos outros órgãos do Estado (como sucede no sistema venezuelano).
Do ponto de vista da teoria dos poderes do Estado, considera-se que o Ministério Público:
·         Não desenvolve actividade preventiva da violação da ordem pública, por não realizar actividade de polícia administrativa; logo, não pertence à função executiva ou administrativa;
·          Não realiza actividade geral, do tipo produção normativo, para além de suas funções internas para o aplicativo do direito (sem prejuízo da doutrina dos actos próprios), pelo que não é parte da função legislativa;
·         Realiza actividade de aplicação do direito, do tipo repressiva das infracções à ordem penal, pelo que se segue que a sua função é uma espécie que cai dentro da função judiciária, junto aos tribunais que exercem jurisdição.
CONTEXTO HISTÓRICO DO MINISTÉRIO PÚBLICO EM ANGOLA
Após o alcance da independência de Angola, um dos diplomas considerado como mais importante contendo matérias que dizem respeito ao processo penal aplicáveis quer pelos tribunais comuns quer pelas jurisdições extraordinárias ou especiais existentes até ao presente momento é a Lei n.º 4/79, de 27 de Abril que, institucionalizou a Procuradoria- Geral da República e do Ministério Público dentro do ordenamento jurídico Angolano.
O primeiro regulamento orgânico foi publicado e aprovado pelo Decreto n.º 25/80, de 24 de Março, e anos depois foi publicada a Lei n.º 18/88, de 31 de Dezembro que aprovou e instituiu o Sistema Unificado de Justiça, em que introduziu alterações e consequentes inovações na organização judiciária do País.
Sendo a Procuradoria-Geral da República, órgão tradicional vocacionado para a fiscalização da legalidade junto dos Tribunais e órgãos auxiliares de administração da justiça, como a firma NÉLIA DANIEL DIAS, foi inevitavelmente abrangida por essas transformações operada pela Lei n.º 18/88, de 31 de Dezembro- Lei do Sistema Unificado de Justiça, por esse motivo, tinha que se adaptar a estrutura, organização e funcionamento da Procuradoria-Geral da República atendendo a aquela nova organização judiciária do País.
Por outro lado, atendendo a experiência acumulada durante anos de funcionamento da Procuradoria-Geral da República, resultaram em outras alterações, relacionadas ou não com as funções específicas de Ministério Público, que a tornam mais amplo e profundo o trabalho a desenvolver pelo Ministério Público como Órgão do Estado, e dotado de maior eficácia na sua atuação, foi assim publicada a Lei n.º 5/ 90 de 7 de Abril -Lei Orgânica da Procuradoria-Geral da República, em que revogou a Lei n.º 25/80, onde no seu art.º 1.º definia que:
AProcuradoria-Geral da República tem como função principal o controlo da legalidadesocialista, velando pelo estrito cumprimento da leis e demais disposições legais por parte dosorganismos do Estado, entidades económicas e sociais e pelos cidadãos.
A aprovação dessa Lei Orgânica foi no período da I República, em que a anterior Lei Constitucional Angolana foi adotada e inspirada segundo o regime Socialista Soviético. Na vigência da anterior lei n.º 5/90 de 7 de Abril, a Procuradoria-Geral da República como órgão do Estado estava subordinada ao Presidente da República como chefe de Estado, e organizava-se verticalmente sob a direção do Procurador-Geral da República, e era independente dos órgãos do poder local do Estado.
Atualmente, mesmo com a aprovação de uma nova Lei Orgânica da Procuradoria-Geral da República e do Ministério Público, continua a ser difícil falar em autonomia e independência no seu verdadeiro sentido do Ministério Público face ao poder Executivo.
O que nos questionamos é o fato de o Procurador-Geral da República receber instruções diretas do Presidente da República, no âmbito da representação do Estado pela Procuradoria-Geral da República, o que a nosso ver pode resultar em interferência política na Procuradoria-Geral da República, porém, isto pode resultar em fragilização do Ministério Público, e mostrar-se-á impotente para cumprir as suas funções Constitucionais em casos mais controversos e complexos da justiça Angolana, o que não é bom para a afirmação do Estado de Direito Material.
Democrático, onde se projetou o Princípio Dignidade da Pessoa Humana como valor supremo do Estado; o Princípio da Juridicidade e da Constitucionalidade; o Princípio da Separação de Poderes; o Princípio da Segurança Jurídica e da Proteção da Confiança; e o Princípio da Igualdade consagrados na atual Constituição da República de Angola.
Face o atual quadro constitucional Angolano consagrados na Constituição de 2010, sem olvidar o anterior quadro constitucional, e por forma a materializar e a dotar o Ministério Público com a consagração constitucional que lhe foi reconhecida, de instrumentos capazes e eficientes, foi aprovada e publicada a atual Lei n.º 22/12 de 14 de Agosto- Lei Orgânica da Procuradoria-Geral da República e do Ministério Público, em que revogou as demais leis anteriores.
O Ministério Público teve que moldar-se e ajustar-se à nova ordem constitucional, onde obtém uma referência constitucional explícita e sistematicamente autónoma, em que se realça a sua posição tanto da Procuradoria-Geral da República- dirigida pelo Procurador-Geral da República- como do Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público.
Em que lhe define: “ O Ministério Público é o órgão do Estado a quem compete representar o Estado, Defender a Legalidade Democrática e os interesses que a lei determinar, Promover o Processo Penal, Exercer a Ação Penal, nos termos da lei nomeadamente:
a) Representar o Estado junto dos Tribunais;
b) Exercer o patrocínio judiciário de incapazes, de menores e de ausentes;
c) Promover o processo penal e exercer a ação penal;
d) Defender os interesses coletivos e difusos;
e) Promover a execução das decisões judiciais;
f) Dirigir a fase preparatória dos processos penais, sem prejuízo da fiscalização das garantias fundamentais dos cidadãos por magistrado judicial, nos termos da lei.
Atualmente a Procuradoria-Geral da República, também é especificamente referenciada no atual texto Constitucional como: Órgão do Estado com a função de representação do estado, nomeadamente no Exercício da Ação Penal, Defesa dos Direitos de outras pessoas Singulares ou Coletivas, Defesa da Legalidade no Exercício da função Jurisdicional e de Fiscalização da legalidade na fase de Instrução Preparatória dos Processos, bem como no que concerne ao cumprimento das penas.
Este é depois de um processo que começou desde a sua institucionalização, bem como o seu reconhecimento na constituição, organização e atribuição de competências, que atualmente é e apresenta o atual contexto do Ministério Público em Angola.

ORGANIZAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO
Organização do Ministério Público em Angola:
Do olhar visível e aglutinador da atual Constituição da República de Angola, sem olvidar à anterior Lei Constitucional de 1992, consagra-se dentro Poder Judicial, Angolano ao lado das várias realidades do Poder Judicial, localizando-se mas concretamente no Capítulo IV do Título IV na Secção III- O Ministério Público, e dela encontram-se os grandes pilares da Organização do Ministério Público em Angola. Com efeito, a Lei Orgânica da Procuradoria-Geral da República e do Ministério Público materializa as orientações constitucionais, aglutinando também a realidade do Ministério Público, que é definido neste ato legislativo como o «órgão da Procuradoria-Geral da República essencial à função jurisdicional».
O Ministério Público em Angola, é historicamente exercido pela Procuradoria -Geral República, institucionalizada pela [Lei nº. 4/79, de 27 de Abril, e cujo regulamento orgânico foi publicado pelo Decreto n.º 25/80, de 24 de Março, atualmente revogado pela [Lei n.º 22/12 de 14 de Agosto- Lei Orgânica da Procuradoria-Geral da República e do Ministério Público].
O art.º 189.º, n.º 3 da CRA determina como Órgãos essenciais da Procuradoria-Geral da República:
O Ministério Público, O Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público, e a Procuradoria Militar.
O Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público é o órgão superior de gestão e disciplina da Magistratura do Ministério Público, funcionando em Plenário e em Comissão Permanente [art.º 190.º da CRA].
E a Procuradoria Militar, é o órgão da Procuradoria-Geral da República, cuja função é o controlo e a fiscalização da legalidade no seio das Forças Armadas Angolanas, da Polícia Nacional e dos Órgãos de Segurança e Ordem Interna, garantido o estrito cumprimento da lei [art.º 191.º da CRA].
Seguidamente, nos termos da LOPGRMP, a Procuradoria-Geral República constitui uma unidade orgânica subordinada ao Presidente da República, como Chefe de Estado, e organiza-se verticalmente, sob a Direção do Procurador-Geral da República, que recebe instruções diretas e de cumprimento obrigatório do Presidente da República no âmbito da representação do Estado pela Procuradoria-Geral República, e é independente dos demais órgãos do poder Local.
A Procuradoria-Geral da República tem a sua Sede na Capital do País, e Estruturalmente adequa-se à organização Judiciária do País;
NoÂmbito Central a direção Procuradoria Geral da República em todo o Território Angolano cabe ao Procurador-Geral da República, que é assistido por Vice-Procuradores Gerais da República, e por Procuradores Gerais-Adjuntos da República;
ANível Local a direção da Procuradoria-Geral da República na área de Jurisdição do Tribunal de Comarca e na Província, compete a um Sub-Procurador Geral da República, que é coadjuvado por Procuradores da República; na área de Jurisdição doJulgado Municipal, a direção da Procuradoria-Geral da República Compete a um ProcuradorAdjunto da República, nas situações em que não tiver sido nomeado Magistrado de nível superior.
A Nível Central, e Local, os Órgãos da Procuradoria-Geral da República, estão organizados em Direções, Gabinetes, Departamentos, Serviços, Repartições, e Secções, tendo como pressupostos as necessidades de serviço315. Ainda nesta senda, ao abrigo da referida Lei Orgânica, integram a Procuradoria-Geral da República: O Ministério Público, O Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público e a Procuradoria Militar.
Nos termos da Lei Orgânica vamos nos parágrafos seguintes descortinar sobre Órgãos da PGR:
Órgãos Singulares da Procuradoria- Geral da República:
a) O Procurador-Geral da República;
b) Os Vice-Procuradores Gerais da República;
c) Os Procuradores Gerais- Adjuntos da República;
d) Os Sub-Procuradores Gerais da República;
e) Os Procuradores da República;
f) Os Procuradores-Adjuntos da República.
Órgãos Colegiais da Procuradoria-Geral da República:
a) O Conselho Consultivo;
b)O Conselho de Direção.
Órgãos Executivos:
a) As Direções;
b) Os Gabinetes;
c) Os Departamentos;
d) Os Serviços;
e) As Repartições;
f) As Secções.
O Ministério Público está também representado junto dos Tribunais, nos seguintes moldes:
a) No Tribunal Supremo- Por Procurador-Geral da República;
b) Nos Tribunais Da Relação-Por Magistrados a designar;
c) Nos Tribunais de Comarca- Por Sub-Procurador-Geral da República, neste último, quando o Tribunal de Comarca se encontrar dividido em salas ou secções, o Ministério Público é ali representado por Magistrado designados para o efeito;
d) Nos Julgados Municipais- Por Procurador-Adjunto da República, cuja titularidade pode ser assumida por Magistrado de categoria Superior, mediante a nomeação do Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público.
O Ministério Público está igualmente representado junto dos Órgãos Centrais de Polícia Criminal, nomeadamente no Serviço De Investigação Criminal, na Direção Nacional de Inspeção e Investigação das Atividades Económicas bem como nos respetivos Serviços, e no Serviço de Migração Estrangeiros, por um Sub-Procurador-Geral da República. Portanto, Junto dos Órgãos Provinciais de Polícia Criminal, do Serviço de Migração e Estrangeiros, e Cadeias Comarcas funcionam Magistrados do Ministério Público, designados pelo Procurador titular da Província mediante homologação do Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público.
GRANDÃO RAMOS considera que, em Angola os Órgãos do Ministério Público formam uma Magistratura totalmente desligada da Magistratura Judicial, a não ser pela convergência das suas atividades no que concerne ao fim que as domina, a máxime “realização do direito penal e a administração da justiça”, e quanto à sua estrutura interna, constituem uma magistratura hierarquizada e dependente, isto é, funcionando como unidade orgânica na qual a atividade dos escalões inferiores se desenvolve sob a superintendência e as instruções dos escalões superiores.

COMPETÊNCIAS DO MINISTÉRIO PÚBLICO
COMPETÊNCIAS DO MINISTÉRIO PÚBLICO EM ANGOLA
Face ao atual quadro Constitucional Angolano com uma referência explícita e sistematicamente autónoma, confere ao Ministério Público determinando no seu Capítulo IV, na Secção III, no artigo 186º, conferindo assim as diversas atribuições e competências:
a) Representar o Estado junto dos Tribunais;
b) Exercer o Patrocínio Judiciário de Incapazes, de Menores e de Ausentes;
c) Promover o Processo Penal e Exercer a ação Penal;
d) Defender os Interesses Coletivos e Difusos;
e) Dirigir a Fase Preparatória dos Processos Penais, sem Prejuízo da Fiscalização das Garantias Fundamentais dos Cidadãos por Magistrado Judicial, nos termos da Lei.
A Procuradoria-Geral da República é especificamente referenciada na Constituição Angolana na Secção III, no artigo 189.º determinando que:
A Procuradoria-Geral da República é um organismo do Estado com a função de Representação do Estado, nomeadamente no Exercício da ação Penal, de Defesa dos Direitos de outras Pessoas Singulares ou Coletivas, de Defesa da Legalidade no Exercício da Função Jurisdicional e de Fiscalização da Legalidade na Fase de Instrução Preparatória dos Processos e no que toca ao Cumprimento das Penas.
A atual [Lei n.º 22/12 de 14 de Agosto] Lei Orgânica da Procuradoria-Geral da República e do Ministério Público (LOPGRM), materializa e concretiza as orientações Constitucionais aglutinando também, que o Ministério Público é órgão da Procuradoria-Geral da República essencial à função jurisdicional a quem compete Representar o Estado, Defender a Legalidade Democrática e os Interesses que Lei determinar, Promover o Processo Penal e Exercer Ação Penal nos termos da Constituição e da Lei.
O EXERCÍCIO DA AÇÃO PENAL PELO MINISTÉRIO PÚBLICO
Ao Estado, como estrutura política e orgânica de uma sociedade, compete-lhe levar a efeito todo trabalho de defesa e de proteção da mesma, reagindo contra os atos e situações menos conformes às leis e à ordem estabelecida, porque violadores e lesivos de direitos e interesses legalmente protegidos, exercer, consequentemente em relação aos autores de tais lesões, todo o “Jus puniendi” de que legitimamente é titular.
Ao Ministério Público, como representante da pretensão punitiva do Estado, é delegado pela sociedade para a tutela dos direitos dos cidadãos ofendidos pelo crime, isto é num plano da igualdade e de imparcialidade, com efeito, a sua função é a expressão de um interesse muito mais elevado em que deve ser inspirada por uma sinceridade de convicção e por uma Objetividade muito maiores, deve defender os interesses que a lei determinar e Exercer a Ação Penal Orientada pelo Princípio da Legalidade. Entre as diversas atribuições e competências que os textos Constitucionais Angolano art.º 189.º, n.º1 CRA como o Português art.º 219.º, n.º 1 CRP conferem ao Ministério Público consagra-se o Exercício da Ação Penal. Por força dos imperativos constitucionais, as demais leis infraconstitucionais “Lei Orgânica da Procuradoria-Geral da República e do Ministério Público, Estatuto do Ministério Público, Código de Processo Penal Português; DecretoLei 35 007- de 13 de Outubro de 1945,” resulta que ao Ministério Público Compete o Exercício da Ação Penal orientada pelo Princípio da Legalidade.
Em Angola, para além do Ministério Público, podem exercer a ação penal a título excecional outras entidades, nos casos a que correspondem processo de Transgressão ou Sumário em que a Instrução preparatória pode ser substituída por autos de autos de notícia que fazem fé em juízo [art.º 2.º do DL- N.º 35 007; e art.º 169.º do CPPA.]. O exercício da ação penal por essas entidades não impede que o Ministério Público a exerça também, nem que ele tome, posteriormente, a posição que entender mais conforme à lei e ao fim do processo.
O exercício da ação penal, sob os postulados do princípio da legalidade, da objetividade e da isenção, deve também observar os limites impostos pela natureza do crime: público, semipúblico, e particular. A legitimidade originária do Ministério Público, restringe-se aos crimes públicos e em segundo segmento aos crimes semi-públicos e particulares, pois se os legítimos titulares do direito de queixa não exercerem não deve ser o Estado substituir-se á vontade subjetiva do particular para promoção da ação penal.
Destaca MANUEL CAVALEIRO DE FERREIRA, “o exercício da ação penal constitucionalmente entregue ao Ministério Público, não Significa, porém, que caiba ao Ministério Público o «Monopólio» do exercício da ação penal.
A ação penal é sempre um direito público, isto é, a ação penal é por sua natureza ação penal pública e mesmo exercida por particulares não pode considerar-se como exercício de um direito de natureza privada.
Considera o autor que, a ação penal distingue-se, «quanto aos seus sujeitos que a podem exercer e, não quanto a sua natureza, em Ação Penal Pública e Privada». Para o autor há, portanto, a possibilidade de litisconsórcio de ação Penal Pública (do Ministério Público) e Privada, possibilidade que desde a criação do Acusador Público tem tomado uma maior ou menor extensão.
O plano da legalidade e objetividade inerente ao Ministério Público, que o obriga a carrear para o processo criminal as provas que indiciam e as provas que inocentam estende-se aos órgãos de polícia criminal, e deve e orientar o JIC na fase de instrução, e os princípios da lealdade, sendo este o mais alto princípio do processo penal contemporâneo, como vetores de orientação na investigação criminal, impõe-se como pilares da garantia efetiva dos direitos e liberdades dos cidadãos, sob pena de nas situações de violações, gerarem proibições de prova.
A ação penal pressupõe o poder de orientação do inquérito, incluídas todas as diligências de investigação criminal, portanto, a ação penal Constitucionalmente consagrada não admite uma orientação posterior da investigação criminal levada a cabo pelos Órgãos de Polícia Criminal, no âmbito da sua autonomia orgânica e hierárquica e a necessária autonomia tática e técnica, mas uma efetiva orientação e direção da investigação criminal, podendo fiscalizar o desenrolar da investigação, avocar o processo a todo o tempo, pedir a prestação de informações sobre o andamento do processo, dar instruções concretas, determinar meios de obtenção de provas e inquerição de testemunhas ou a recolha de informações criminais pertinentes para a decisão de acusar ou de arquivar o processo ou que fundamentam a decisão da opção pela implementação do princípio da oportunidade.
Como está instituído no ordenamento jurídico processual penal português e angolano, concordamos com GUEDES VALENTE ao afirmar que, “o Ministério Público detém o Monopólio da ação penal e da consequente investigação criminal, que deve exercer dentro da independência e autonomia constitucionalmente atribuída face a outros intervenientes no processo, incluindo o juiz, e a outros fatores externos ao processo (políticos, comunicação social, pressão popular) ”.
A ação penal estatal segundo autor “restringe direitos, liberdades e garantias fundamentais do cidadão no sentido da justiça se realizar. Para o autor, a ação penal não pode ser pedestalizada, sacralizada ou deificada em detrimento da liberdade individual, porém, a ação dos operadores judiciários em matéria penal implica uma harmonização inerente ao convívio mútuo entre a liberdade e segurança, impelindo à cedência de um em detrimento do outro sem que qualquer dos direitos perca o seu conteúdo e alcance essencial e, nunca, algum deles pode ferir a área centrífuga da dignidade da pessoa humana.
Segundo o autor, esta Concordância Prática ou harmonização dos princípios e direitos em conflito devem emergir de uma política criminal valorativa do ser humano criadora de uma dogmática-jurídico criminal do cidadão, em que se prefere a não realização da justiça a uma justiça subordinada a métodos enganosos, tortuosos e desumanos e a sanções penais desumanas, degradantes e humilhantes.
 A ação penal desenvolve-se com meios que restringem direitos e liberdades dos cidadãos nomeadamente da «Vítima: quando submetida a um exame ou perícia médico-legal para obtenção de prova real de um crime sexual», «Comunidade Local Geral quando é obrigada a manter-se no local do crime para obtenção de informações e da prova pessoal» e o «Arguido ou Acusado: imputação de um tipo legal de crime, sujeição a um processo-crime, à aplicação de medidas cautelares e de polícia, a um conjunto de meios de prova e de obtenção de prova, a uma acusação, a um julgamento e a uma condenação e execução da pena».
Entendemos que esses meios carecem de legitimidade na dupla vertente:
Em primeiro segmento compete à lei imanada do órgão eleito pelo povo, denominada Legitimação Normativa”; e em segundo segmento, a lei em si mesma e a atividade processual penal estatal devem sentir-se necessárias e úteis aos olhos dos cidadãos, denominada “Legitimação Social”, os meios de intervenção e de ação devem ser, normativa e sociologicamente, legítimos.
Seguimos o autor ao quando defende que, “a política criminal deve dotar a dogmática jurídico-criminal de uma legitimidade sociológica, apresentando os meios que obedeçam aos princípios da necessidade e da utilidade dos meios face ao fim da política criminal e da dogmática-jurídico criminal”.
Para o autor no que tange ao quadro da intervenção estatal há que saber se o meio será a intervenção criminal, ou a intervenção administrativa sancionatória ou a intervenção meramente terapêutica; decidindo-se pela intervenção criminal é necessário que se apure os elementos objetivos e subjetivos, o bem jurídico, o tipo de penas ou medida de segurança privativas ou não privativas da liberdade, pecuniárias, não privativa da liberdade, os meios de obtenção de prova e meios de prova, os órgãos componentes para ação penal [Ministério Público, Juiz de Instrução Criminal, Juiz, Advogado, OPC/ Polícia], a regra da publicidade ou do segredo de justiça, a opção da policialização ou de jurisdicionalização do processo, a opção de introdução ou não de institutos do princípio da oportunidade e do consenso, a opção ou não pela mediação penal.
O Ministério Público, ao promover a ação penal, não pode olvidar que o pensamento penal se encontra justamente aconchegado pela cultura dos direitos fundamentais pessoais, enquanto limite inultrapassável de eventuais desmandos funcionais ou simplesmente utilitarista.
Defendemos que o Ministério Público deve orientar a prevenção criminal strito
sensu-repressão do crime, segundo a cultura dos direitos e liberdades fundamentais afetados vítima e comunidade e a afetar arguido, neste sentido, os princípios do garantismo e da democracia e o primado ou imperativo dos direitos fundamentais pessoais, devem guiar toda a decisão legiferante, a ação penal, e a ação de julgar, bem como ação preventiva da polícia.
Nesta amplitude de ação do Estado-MP e Polícia, a dignidade da pessoa humana ocupa o espaço da ponte da dogmática à filosofia, da ciência teórica à prática, da doutrina à realização concreta do direito.
A ação penal estatal e a ação preventiva orientam-se sob primado dos princípios político criminais centrados no ser Humano, tais como o da Legalidade ou do Estado de Direito Material, Culpabilidade, Humanidade, ressocialização ou tratamento.
A ação de prevenção criminal strictosensuque ingressa na ação penal, é um momento ou fase primordial e fundamental para o apuramento da censurabilidade jurídico criminal da conduta negativa originária da ação penal e da prossecução dos fins do processo penal concretizada na “ descoberta da verdade, a realização da justiça, defesa e garantia dos direitos fundamentais dos cidadãos e o alcance da paz jurídica, e do direito penal materializada na tutela de bens jurídico e a defesa do delinquente face ao iuspuniendi, pelo que seguimos GUEDES VALENTE ao afirmar que, “a verdade material implica a descoberta dos elementos objetivos e dos elementos subjetivos que permitam aferir a culpabilidade, sendo esta o fundamento e limite da punibilidade e da realização da justiça com a aplicação de uma pena justa para que se alcance a paz jurídica no respeito e promoção dos direitos liberdades fundamentais do arguido e da vítima”.
A ação penal tem limites, e um desses limites consiste na culpa do agente da prática do crime em investigação, e a lei geral e processual penal em especial deve materializar que não pode iniciar uma investigação criminal que acarreta o prejuízo da culpa, mais sim realizada sob um pleno juízo de presunção de inocência, sendo que a ação penal ali se integra, e deve desenrolar-se sob a égide do princípio da presunção de inocência.
Contudo, não olvidamos que o Ministério Público, ao deduzir a acusação e ao fundamentar e defendê-la em sede de audiência de julgamento, por meio de apresentação dos meios de prova, visa demonstrar a culpabilidade do arguido, mas se no decurso da investigação criminal do caso concreto o MP, coadjuvado pelos OPC concluir pela não relevância substantiva do fato por inexistência de culpa, cumpre-lhe o dever de não acusar, e tendo acusado, pedir a absolvição na fase de julgamento.
Entendemos que a relevância jurídico-criminal que recaí sobre o exercício da ação penal reside no apurar a culpabilidade em que se apresenta como barreira inultrapassável da efetiva intervenção penal.
A ação penal vive dentro de um processo-crime que se inicia com a notícia do crime que origina um inquérito, atribuído a um Magistrado do Ministério Público, que está num tribunal que administrará a justiça em nome do povo, e para o cumprimento desta missão, a constituição impõe a coadjuvação de todas entidades públicas ou privadas, e dessas entidades públicas destaca-se a coadjuvação levada a cabo pela Polícia em toda tridimensionalidade constitucional (Ordem Pública, Administrativa, e Judiciária), quer na prossecução de atos delegados por despacho de natureza genérica ou por despacho concreto, quer por iniciativa própria, na prossecução de medidas cautelares e da polícia, solidificada em atos pré-processuais, precários, urgentes e temporários que terão de ser apreciadas e validadas pela autoridade judiciária competente.
Do exposto, questiona-se sobre o fim da Ação Penal? Para responder-se a questão suscitada, seguimos a linha de pensamento de GUEDES VALENTE ao afirmar que, “a Açãode Prevenção Criminal e a Ação Penal, prosseguem um fim público único que é arealização efetiva do Direito como realidade do bem e da justiça por meio da tentativa deevitabilidade de lesão ou da reposição da norma jurídica lesada por uma condutahumana”.
Acresce o autor, o interesse público prosseguido pela Polícia e pelo Ministério Público, deve ser objetivo da normatividade jurídico-constitucional legítima, válida, vigente, e efetiva e, portanto, não individualizado ou individualizável por ser pertença de um público, pertence a um grupo indistinto e não se identifica com interesses dos eventuais membros, e não obstante a prevenção e a repressão criminal nascerem da ofensa a um bem jurídico-penal individual, da reintegração do bem jurídico e da reinserção com responsabilidade do criminoso, é um interesse objetivo, de um público de uma comunidade (coletiva) e indistinto quanto ao destinatário da ação de prevenção ou de repressão criminal”.
A posição e atribuições do Ministério Público no exercício da ação penal e no processo penal consistem, a execução do programa constitucional, orientadas pela imparcialidade, objetividade e segundo o princípio da legalidade.
Porquanto, a inscrição do princípio da legalidade, como orientador da ação penal, significa que a constituição tomou expressamente opção na alternativa entre o princípio da legalidade, com obrigatoriedade do exercício da ação penal, e o princípio da oportunidade, a Constituição fixou, deste modo uma orientação que faz prevalecer o princípio da legalidade na ação penal, e essa opção constitucionalmente consagrada significa, que são excluídos critérios de oportunidade no exercício da ação penal, mas não significa, ao contrário, que o exercício da ação penal seja absolutizado ou identificado com a obrigatoriedade de acusação em todos os casos e circunstâncias, porém, a exclusão constitucional da oportunidade como critério ou modelo não impede a abertura a fórmulas processuais de seleção ou de diversão, desde que submetidas a critérios e pressupostos predeterminados e objetivos.
O MINISTÉRIO PÚBLICO E O ACESSO AO DIREITO E À JUSTIÇA
O Ministério Público é um factor importante nos mecanismos existentes de acesso ao
direito e à justiça dos cidadãos. A evolução deste órgão judicial tem conferido uma
importância cada vez mais relevante à sua acção, devido, não só ao alargamento das suas
competências, mas também à melhoria da capacidade de exercício das suas funções, em pane resultantes de um processo de afirmação institucional contínuo que decorre desde o 25 de Abril de 1974.
O actual modelo de autonomia do Ministério Público compreende um conjunto vasto de competências, entre as quais, a direcção da investigação criminal e o exercício da acção penal, a promoção e coordenação de acções de prevenção criminal, o controlo da constitucionalidade das leis e regulamentos, a fiscalização da Polícia Judiciária, a promoção dos direitos sociais (laboral e menores e família), para além da defesa dos interesses do Estado e dos interesses difusos (ex: ambiente, consumo, etc.).
No entanto, e com tradições históricas, o Ministério Público desempenha igualmente um papel crucial no acesso dos cidadãos ao direito e à justiça, visto ser, em muitas situações, o primeiro contacto dos cidadãos com o sistema judicial. Este papel é desempenhado no âmbito das suas competências, mas inclui igualmente mecanismos informais de exercício, conferindo-lhe uma importância muito superior à visível nas estatísticas judiciais (em particular nas áreas de cariz mais social, ao nível dos trabalhadores e da família e dos menores).
A sua posição de "charneira", que se caracteriza por estar dentro do sistema oficial de justiça e poder cooperar e estabelecer parcerias com outras instituições estatais, entidades privadas ou entidades da sociedade civil, numa fase ainda prévia à instauração de um processo judicial, permite-lhe deter um papel preponderante na articulação entre os meios formais e os meios informais de resolução de conflitos, para além de poder igualmente assumir qualquer um destes papéis.
O facto de poder exercer, e muitas vezes o fazer, não significa que o faça sempre... Este tema é de grande importância por se observar nos últimos anos uma tendência para a reformulação das competências e do papel desempenhado pelas várias (novas e velhas) profissões jurídicas que operam no sistema judicial português, através da introdução de processos de desjudicialização e informatização da justiça que facilitem o acesso dos cidadãos ao direito e à justiça.
Por conseguinte, é deveras importante estudar as múltiplas formas de relacionamento que os cidadãos estabelecem com o Ministério Público, quer no âmbito das suas competências legais, quer através da sua prática informal, bem como refletir sobre as eventuais mudanças que seja necessário introduzir e as competências que deve, efectivamente, exercer, tendo em consideração as competências das restantes profissões jurídicas.
Esta diversidade de actuações confere ao Ministério Público um carácter de multifuncionalidade, que por vezes é vista de forma negativa. Contudo, creio que uma magistratura bem formada e moldada às necessidades dos cidadãos pode deter mais-valias do que aspectos negativos.
INSTRUÇÃO PREPARATÓRIA
Em Angola, a instrução preparatória é a primeira fase do processo penal, da competência do Ministério Público, e abrange o conjunto de diligências de busca e recolhas de provas que formam o corpo de delito e que tem por fim reunir os elementos de indiciação necessários para fundamentar a acusação.
É aberta com a notícia ou conhecimento de que foi cometida uma infração, esse conhecimento pode ser direto (Oficioso) ou obtido através da informação de terceiras pessoas. Para que haja esse conhecimento necessário à abertura da instrução preparatória, basta a simples suspeita de um crime.
A instrução preparatória em Angola é secreta “art.º 13.º do Decreto-lei n.º 35 007- o que significa que nem o arguido nem o seu advogado em princípio podem consultar o processo.
Mas isto não significa que não possam intervir na instrução, requerendo diligências de prova, juntando documentos, indicando testemunhas e expondo tudo o que entenderem no sentido da descoberta da verdade, art.º § 1.º do art.º 13.º do Decreto- Lei n.º 35 007. Mesmo declarado segredo de justiça, o processo pode ser mostrado ao arguido, assistente e os advogados nos casos em que não haja inconveniência para a descoberta da verdade, art.º 70.º CPPA.
É dominada pelo princípio do inquisitório e, nos processos sumário, sempre que haja flagrante delito por infração a que for aplicável pena de prisão até dois anos e julgados sumariamente, é dispensada a instrução preparatória. Em princípio, em Angola, a instrução preparatória deverá ultimar-se havendo arguido presos, e em prazo consentâneo com a duração da prisão preventiva, não havendo arguidos presos o prazo da instrução preparatória é de 3 meses em processo de querela e de dois meses nos outros processos.
E a mesma conclui-se quando o Ministério Público deduz a acusação, ou abstendo-se de acusar por insuficiência de prova, o MP ordenará que o processo seja arquivado ou aguardará a produção de melhor prova.
AÇÃO PENAL
É definida como sendo a ação que é exercida pelo Ministério Público (a lei utiliza a expressão exercer a ação penal), com o carácter eminentemente público: em processo penal, o Estado é o titular da ação penal, exercendo o seu poder de prossecução criminal por intermédio e representado por aquele. Traduz-se na realização de um conjunto de atos, legalmente ordenados, que visam a determinação da responsabilidade criminal do (s) agente (s) do (s) crime (s).
Para GUEDES VALENTE, o exercício da ação penal constitucionalmente consagrado, apresenta-se como uma das funções de maior relevo do Ministério Público, que, de modo isento, baseando-se nos postulados dos princípios da separação de funções, da legalidade, da objetividade, da imparcialidade da autonomia, deverá investigar os fatos que lhe são apresentados ou de que tem conhecimentos, de forma que as conclusões do inquérito, cuja direção lhe compete, aparecendo no atual contexto processual penal como o dominus do inquérito, em que cuja atuação dos órgãos de polícia criminal está sob a sua dependência funcional e orientação, que lhe permitam deduzir uma acusação fundamentada ou arquivar o inquérito.
Seguimos o autor quando defende que, “o exercício da ação penal, depende de uma excelente e profícua investigação criminal que deve estar isenta de quaisquer traços arbitrários, para que se efetue uma real defesa da legalidade, e se garanta a segurança interna e os direitos dos cidadãos".
O Ministério Público, como Magistratura autónoma Constitucionalmente estabelecida, encontra-se, no exercício das funções, máxime no exercício da ação penal, sujeito ao princípio e regras absolutamente intangíveis, entre elas o princípio da legalidade e da busca da verdade material, o que o obriga à «charge» e à «descharge». Continuamos a acompanhar o mesmo autor, quando afirma que, “a ação de prevenção e strictosensu.(Polícia) e a ação penal (MP) estão umbilicalmente presas ao apuramento integral da culpa e, para chegar a esse porto, devem desenvolver toda a investigação sob a égide do princípio da presunção da inocência”.
Para o autor, o princípio da culpabilidade orientador da política criminal e da intervenção da ação preventiva strictosensu(Polícia) e da ação penal (MP), bem como da ação repressiva final (Juiz), deve ser a barreira que a comunidade estatal autoestabelece na intervenção sobre um membro que atuou culposamente, devido ao fato de reconhecer a preeminência da sua dignidade por cima dos interesses da comunidade na efetividade da luta contra o crime.
ARGUIDO
MARIA PAULA GOUVEIA ANDRADE considera o arguido «a pessoa que é formalmente constituída como sujeito processual e relativamente a quem corre processo como eventual responsável pelo crime que constitui o seu objeto». No que concerne à noção de arguido, o código de processo penal angolano define o arguido como sendo a pessoa sobre a qual recaia forte suspeita de ter perpetrado uma infração cuja existência esteja suficientemente comprovada.
Ao passo que, o atual código processo penal português, atribui a qualidade de arguido a todo aquele contra quem for deduzida uma acusação, ou requerida uma instrução num processo penal.
Em Portugal, a constituição de arguido opera-se mediante comunicação feita ao visado por uma autoridade judiciária ou um órgão de polícia criminal. Se a constituição de arguido for feita por um OPC, deve ser comunicada à autoridade judiciária no prazo de 10 dias e por esta apreciada, em ordem à sua validação no prazo de 10 dias.
Em Angola, a constituição arguido opera-se logo que com base na denúncia ou no resultado de diligências probatórias, a instrução preparatória seja dirigida contra pessoa determinada.
OFENDIDO, ASSISTENTE E LESADOS
Consideram-se ofendidos quer processo penal angolano e português os titulares dos interesses que a lei especialmente quis proteger com a incriminação. O ofendido segundo GERMANO M. DA SILVA, não é sujeito processual, salvo se constituir assistente.
O Assistente é o sujeito Processual que intervém no processo como colaborador do Ministério Público na promoção da aplicação da lei ao caso, e legitimado em virtude da sua qualidade de ofendido e de especiais relações com o ofendido pelo crime ou pela natureza do próprio crime.
Considera-se lesado, aquele que sofreu danos com o crime. Defende o autor, “esse conceito, pode coincidir e muitas vezes coincide com o ofendido e, por isso, pode também constituir-se assistente, não por ser lesado, mas por ser ofendido. Para o autor, em razão da sua qualidade de lesado pode apenas intervir no processo como parte civil no pedido de indeminização”.
ACUSAÇÃO
A acusação é o ato formal através do qual se formula o pedido para que o arguido seja julgado pelos factos apurados durante a fase do Inquérito ou da Instrução Preparatória. Como refere GERMANO M. DA SILVA, é a “manifestação formal da pretensão de que o arguido seja submetido a julgamento pela prática de determinado crime e por ele condenado com a pena prevista na lei ou requerida pelo Ministério Público, constituindo um pressuposto indispensável da fase de julgamento e por ela se define e fixa o objeto do julgamento”.
MANUEL SIMAS SANTOS considera a acusação como “a terceira modalidade do encerramento do inquérito.
Defende que, diversamente do que sucedia com duas modalidades anteriores, o processo penal prossegue com a introdução do feito em juízo, surgindo a acusação como o ponto final de uma fase processual, o inquérito, para dar lugar a outra fase em que tanto pode ser a fase da instrução como a fase do julgamento”.
No processo penal angolano nos termos dos artigos 349.º e 350.º do CPPA, se da instrução preparatória resultarem indícios suficientes da existência do fato punível, de quem forem os seus agentes e da sua responsabilidade o Ministério Público, se para isso tiver legitimidade, deduzirá acusação. Porém, havendo arguidos presos a acusação será deduzida no prazo de cinco dias em processo de querela e de três dias nas demais formas de processo.
No processo penal português, nos termos do art.º 283.º CPPP, se durante o inquérito tiverem sido recolhido indícios suficientes de se ter verificado crime e de quem foi o seu agente, o Ministério Público, no prazo de 10 dias, deduz a acusação contra aquele.
DENÚNCIA
A denúncia é a comunicação da ocorrência de um facto a uma entidade36. Na esteira de GUEDES VALENTE, “o Auto de Denúncia compreende o documento elaborado pelo Órgão de Polícia Criminal ou pela Autoridade de Polícia Criminal ou, então, pela Autoridade Judiciária, que se destina a narrar, em especial, um crime de natureza semi-pública ou particular, e consigna o designado conhecimento indireto ou por meio de denúncia ficando esta adstrita à vontade do titular do direito de queixa”. Segundo o autor, poder-se-á dar a situação de um cidadão não titular do direito de queixa, se dirigir a uma Autoridade Judiciária ou OPC ou entidade policial para denunciar um crime de natureza pública, devendo, neste caso, ser elaborado um auto de denúncia, em que o denunciante é identificado e assina o auto nessa qualidade.











CONCLUSÃO
Depois da pesquisa feita entanto, e com tradições históricas, o Ministério Público desempenha igualmente um papel crucial no acesso dos cidadãos ao direito e à justiça, visto ser, em muitas situações, o primeiro contacto dos cidadãos com o sistema judicial. Este papel é desempenhado no âmbito das suas competências, mas inclui igualmente mecanismos informais de exercício, conferindo-lhe uma importância muito superior à visível nas estatísticas judiciais (em particular nas áreas de cariz mais social, ao nível dos trabalhadores e da família e dos menores).
A sua posição de "charneira", que se caracteriza por estar dentro do sistema oficial de justiça e poder cooperar e estabelecer parcerias com outras instituições estatais, entidades privadas ou entidades da sociedade civil, numa fase ainda prévia à instauração de um processo judicial, permite-lhe deter um papel preponderante na articulação entre os meios formais e os meios informais de resolução de conflitos, para além de poder igualmente assumir qualquer um destes papéis.
O facto de poder exercer, e muitas vezes o fazer, não significa que o faça sempre... Este tema é de grande importância por se observar nos últimos anos uma tendência para a reformulação das competências e do papel desempenhado pelas várias (novas e velhas) profissões jurídicas que operam no sistema judicial português, através da introdução de processos de desjudicialização e informatização da justiça que facilitem o acesso dos cidadãos ao direito e à justiça.
















SISTEMA ROMANO-GERMÂNICO E O SISTEMA ANGLO-SAXÓNICO

O presente estudo pretende traçar uma análise sobre as diferenças e as semelhanças entre os sistemas da civil law e da common law. Nesse sentido, pretende discutir e analisar, apresentando possíveis respostas, às seguintes perguntas: há tendência à aproximação desses sistemas? A técnica do precedente da common law pode ser usada na civil law?
A busca por maior segurança nas decisões judiciais e a otimização destas, evitando-se o desnecessário exame de casos idênticos já anteriormente decididos e, consequentemente, por uma maior segurança jurídica em prol da sociedade; levou vários países a adotarem mecanismos com o objetivo de uniformizar a jurisprudência.
Os motivos pelos quais advogados e juízes discutem tanto a aplicação do precedentes decorre de uma razão de justiça, em que se deve tratar igualmente casos que tenham semelhanças relevantes com decisões anteriores devem ser decididos de maneira igual ou análoga aos casos passados”.
Além disso, está a ideia de um sistema jurídico imparcial que faz a mesma justiça a todos, independentemente de quem sejam as partes envolvidas e também proporcionar economia de esforços.
Diante desse cenário, são levantados inúmeros fatores que acarretam a ausência da eficiência do Poder Judiciário, dentre eles: a corrupção no seio do Poder Judiciário, a má formação do bacharel em Direito, os inúmeros recursos e sua larga utilização com o intuito meramente protelatório, dentre outros. Não se pretende analisar, nesse trabalho, esses fatores, mas sim o problema que eles geram: a insegurança jurídica e quais mecanismos jurídicos podem ser utilizados ou não para diminuí-la.
Nesse contexto, o presente estudo pretende averiguar se é possível a adoção do sistema de precedentes, originário do modelo da common law, no direito brasileiro; no qual se adota o modelo do civil law, com o objetivo de garantir a segurança jurídica. Para tanto, essa análise se inicia com um breve histórico do sistema da common law e da civil law, suas origens, seus conceitos e sua aplicação nos dias de hoje.
Após isso, passa-se ao estudo do sistema jurídico brasileiro, por meio de um breve histórico, para, ao final, identificar a possibilidade ou não da adoção do sistema dos precedentes no direito brasileiro e extrair algumas conclusões e outros questionamentos.
A partir de um estudo de direito comparado, René David se propõe a fornecer uma obra que analisa os diversos direitos, de cada Estado. Assim, para facilitar seu estudo, o autor agrupa esses direitos em famílias, sobre as quais explica que “não há concordância sobre o modo de efetuar este agrupamento, e sobre quais as famílias de direitos se deve, por conseguinte, conhecer”.
Assim, para ele, o agrupamento dos direitos em família é o meio próprio, reduzindo-os a um número restrito de tipos, para facilitar sua compreensão e apresentação.
Com base nesse estudo, René David trata da família romano-germânica, da família da common law e da família dos direitos socialistas. Importante ressaltar, como o próprio autor destaca que essas famílias são refletem toda a realidade do mundo contemporâneo, mas servem para apresentar um quadro com as principais regras, características e significados.
Nesse ponto, nesse estudo serão apenas analisadas as famílias romano-germânicas e a da common law, já que estão relacionadas com o presente tema.
SISTEMA ROMANO-GERMÂNICO
A família romano-germânica agrupa os países que tiveram a ciência do direito concebida sobre a base do direito romano, tendo seu berço na Europa. Essa família se caracteriza pelo fato de suas regras de direito serem concebidas como regras de conduta, ligadas a preocupações morais e de justiça; além de elaborarem seus direitos visando a regulação das relações entre os cidadãos.
Embora a família romano-germânica tenha conquistado vastos territórios, vários desses países receberam o direito europeu de forma parcial; já que existia, antes dessa recepção, uma civilização autóctone, que comportava certas concepções de agir e viver e certas instituições.
Logo, esses países criaram um novo direito em relação àqueles que constituem a sua aplicação na Europa, pois mantiveram seus princípios tradicionais.
É possível, pois, afirmar que os países que foram colonizados por países tipicamente da família romano-germânica adotam suas principais ideias e fundamentos, mas com algumas ressalvas devidas aos seus contextos históricos.
Dentre esses países que sofreram essa recepção parcial das normas do direito romano-germânico pode-se citar o caso angolano, que sofreu colonização portuguesa. Explica René David (1978, p. 77) que “as colônias espanholas, portuguesas, francesas e holandesas da América aceitaram de modo natural as concepções jurídicas típicas da família romano-germânica”.
Nesse ponto, o próprio autor reconhece que a questão que se levanta “é somente a de saber em que medida as condições próprias da América, muito diferentes das do meio europeu, podem conduzir” a uma certa originalidade em relação aos direitos europeus da família romano-germânica.
Em Roma, berço da família romano-germânica, adotou-se como fonte do direito uma série de textos, que abrangiam tanto legislação, como doutrina. Nesse sistema “quem determinava o direito era um poder superior, que manifestava sua vontade pela positivação das normas de conduta.”.  Por isso a família romano-germânica é caracterizada pela ideia de direito codificado, positivado.

SISTEMA ANGLO – SAXONICO


Já a família que comporta o direito inglês é a denominada família da common law. Nesse ponto, importante trazer a ressalva feita por José Rogério Cruz e Tucci de que o sistema da common law abrange as estruturas judiciárias da Inglaterra, País de Gales, Irlanda do Norte e
Escócia que; embora possuam peculiaridades em razão de vicissitudes históricas, todas elas são baseadas no direito casuístico, ou case law. (TUCCI, 2010, p. 215) Assim, a common law tem como principal fonte do direito os costumes, firmados pelos precedentes dos tribunais.
O direito inglês, marcado pelo sistema da common law, é caracterizado pelo fato de que na ausência de norma escrita os juízes tinham que formular uma decisão para o caso concreto.
Assim, diferentemente da família romano-germânica, na Inglaterra, a fonte principal do direito eram os costumes observados pela sociedade e a conduta social era regulada pela razão, ou por aquilo que os membros da sociedade entendiam como correto.

Esse sistema teve sua formação entre os anos de 1066 e 1485, tendo início com a conquista normanda em 1066, levando para a Inglaterra um “poder forte, centralizado, rico de uma experiência administrativa posta à prova no ducado da Normandia”. Tem-se início o sistema feudal na Inglaterra.
É o feudalismo inglês de caráter militar, organizado; que vai permitir, por oposição ao continente europeu, o desenvolvimento da common law. Surge, assim, o sistema da common law, ou direito comum, para fazer oposição aos costumes locais frutos do feudalismo.
Embora os primeiros juízes da common law tenham aplicado regras de origem germânica – princípios que serviram de alicerce ao sistema jurídico inglês (TUCCI, 2004, p. 152) - verifica-se que “o sistema da common law, desde sua formatação inicial, era considerado tão adequado às necessidades e estava tão bem inserido na realidade social do seu tempo”. (TUCCI, 2004, p. 150).
Assim, José Rogério Cruz e Tucci explica que a “unidade jurídica, a configuração geográfica, a centralização judiciária e a homogeneidade da classe forense justificam a recepção falhada das fontes do direito romano-germânico na Inglaterra.” (TUCCI, 2004, p. 151).
Além disso, observa Tucci que na obra dos primeiros comentaristas da common law já havia nítida preocupação com o problema dos julgamentos contraditórios, surgindo estudos sobre a importância de ater-se, na decisão de casos similares, àqueles que já tinham sido antes decididos. (TUCCI, 2004, p. 153) Por isso, destaca René David que “a common law foi criada pelos Tribunais Reais de Westminster” (DAVID, 1978, p. 428), sendo, portanto, um direito jurisprudencial.
Dessa forma, verifica-se que, desde sua formação, a common law mostrou natural vocação para ser um sistema de case law, pois, embora ainda não houvesse um efeito vinculante ao precedente, os operadores do direito inglês já ressaltavam a relevância dos julgados e a importância de que tais decisões deviam ser seguidas para conferir certeza e continuidade ao direito. (TUCCI, 2004, p. 154) Logo, desde o seu início, o sistema da common law foi orientado pelo brocado stare decisis et non quieta movere, isto é, “a formação da decisão judicial com arrimo em precedente de mesma natureza, eventualmente existente”.



As diferenças no estilo entre os modelos contratuais oriundos de sistemas romano-germânicos e de common law são bem conhecidas. Tradicionalmente, os instrumentos contratuais anglo-saxônicos são mais extensos, minuciosos e individualizados do que aqueles provenientes de países de tradição romanista. As razões para essas discrepâncias não são, porém, suficientemente compreendidas na literatura.
O presente trabalho busca examinar como o papel proeminente dos tipos contratuais na tradição romanista e a sua menor relevância no common law repercute nos padrões de modelagem contratual observados na prática negocial. Do ponto de vista descritivo, a origem anglo-saxônica de expressiva parcela de contratos atípicos – como os contratos terminados em “-ing” (leasing, franchising, engineering, entre outros) – sugere a existência de fatores associados à tradição jurídica. Do ponto de vista normativo, verifica-se um tradeoff entre aredução dos custos de transação proporcionada pela padronização dos tipos contratuais, de um lado, e os desincentivos criados à inovação nas formas contratuais, de outro.
Por fim, concluise por suscitar reflexão sobre o futuro das técnicas de redação contratual em tempos de globalização e sobre os possíveis papéis do Estado na indução da inovação contratual na tradição romano-germânica.



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