A CORRUÇÃO: NA PERSPECTIVA SOCIOLÓGICA, PSICOLÓGICA, JURÍDICA E ECONÓMICA

 

RESUMO

 

 Este trabalho, centrado no estudo da Corrupção, propõe-se conhecer a origem do conceito, mas também as suas causas e consequências, sem esquecer as medidas preventivas e repressivas que poderão contribuir para pôr cobro ao fenómeno.  Buscou-se conhecer os diferentes tipos de corrupção, dando particular atenção aos que são tidos em conta pela Convenção das Nações Unidas Contra Corrupção, por se tratar de um documento que derivou de um consenso alargado.  Nas causas de corrupção, que são inseparáveis das condições nas quais ela tende a proliferar, distinguiu-se entre: culturais, económico-sociais, políticas e jurídicas.  Defende-se um conjunto de medidas económicas e institucionais e as devidas reformas, capazes de conter a corrupção.  Em termos mais específicos, este trabalho visa o estudo do fenómeno da corrupção, através da análise das suas causas e consequências no dia-a-dia das populações. Concluímos que a par dos imensos estrangulamentos temos de ser capazes de valorizar as também imensas oportunidades. Um desafio que, para ser realista e ter sucesso, não dispensa a reflexão sobre o passado nem a firme aposta em novas práticas: políticas, administrativas, socioeconómicas e culturais. É necessário inovar e apostar na transparência e prestação de contas, na criação de uma sociedade participativa e vigilante, numa perspectiva de agregar valor e de potenciar um clima menos favorável a corrupção e que abra o caminho para o desenvolvimento mais sustentável.

 Palavras-Chaves: Corrupção, Fenômeno, Políticas, Consequências, economia.

 

 

 

 

 

 

 

 


 

 

1- INTRODUÇÃO

 

O fenômeno da corrupção é objeto de estudo em diversas áreas do conhecimento sociologia, filosofia, direito ciência política e, principalmente na economia e vem ganhando cada vez mais espaço na literatura e nos debates públicos. É inquestionável que o fenómeno da corrupção tem vindo a ganhar ao longo dos tempos vários contornos e a resistir/persistir em todos os cantos do mundo. Seja nos países desenvolvidos ou não, países de pequenas e grandes dimensões, tanto económica como territorial, com uma economia de mercado ou não, têm conhecido ao longo dos anos escândalos de corrupção, e nalguns casos, com quedas sucessivas de dirigentes. 

As médias têm um papel preponderante nesse processo. E o avanço, cada vez mais, das novas tecnologias, tem impulsionado o papel das média de recordar e denunciar constantemente comportamentos corruptos permanentes, seja público ou privado, e têm, por outro lado, facilitado a busca e difusão de informações a todos os níveis.  Por outro lado, a expansão e aumento do nível de corrupção em várias partes do mundo e a diminuta e limitada intervenção de alguns governantes para porem cobro à corrupção, têm contribuído para que esta seja alvo de uma multiplicidade de estudos e debates tendentes a alertar para a prática e as sequelas dos actos de corrupção e apontar directivas que suscitam reflexões e possíveis decisões.

Este trabalho propõe tratar do tema da corrupção, baseado nas diversas análises propostas por alguns autores de referência, mas com especial ênfase em Senior. Pretende-se, principalmente, definir o fenómeno da corrupção, apresentar os diferentes tipos de corrupção, algumas das suas causas, as consequências, os mecanismos que poderão contribuir para a sua prevenção e combate. (SENIOR Ian, 2006).

1.1. PROBLEMA

Desde os anos setenta, a corrupção tornou-se um tema recorrente dos media e um objecto de debates e de análises elaborados por investigadores oriundos dos mais variados campos de conhecimento, dentre outros, a economia, ciências sociais, direito, política. O interesse dos investigadores, dos jornalistas, bem como dos juízes, advogados ou economistas, explica-se pela dimensão que a corrupção atingiu na esfera dos negócios públicos e privados.  Actualmente, a corrupção é um fenómeno socio-económico universal que pode ser observado nas mais diversas instituições. E os seus autores são indivíduos, pessoas que se aliam por um determinado prazo para um determinado fim. 

1.1.1. Justificativa 

A prática da corrupção é um fenómeno universal que se faz objecto dos mais calorosos debates, tanto no campo académico, quanto jurídico e político, pelo que, por si só, justifica e o coloca como um objecto privilegiado de estudos científicos. As controvérsias existentes começam com a difícil tarefa em definir o conceito de corrupção. O facto de não se ter chegado a uma definição consensual, aponta uma certa dificuldade em precisar os mecanismos eficazes de prevenção e de combate, o que denota que a unificação de esforços em torno da vontade em limitar os actos de corrupção, ainda está longe de ser alcançada. Por isso, entende-se que novos estudos para analisar este fenómeno, podem contribuir para enriquecer reflexões e análises actuais e que, a médio e longo prazos, poderão ser utilizados como suporte para se pensar na adopção de novas leis e soluções no combate à corrupção.

1.2. OBJECTIVOS

1.2.1. Gerais

O trabalho tem como objectivo Geral o Estudo do Fenómeno de Corrupção.   

Pretende-se apresentar uma listagem que compõem a fonte de comparação que deu origem a definição do fenómeno, adoptada como suporte deste trabalho. A corrupção é um fenómeno complexo e dinâmico que requer medidas concretas e interligadas, por isso, pretende-se apontar algumas estratégias e propostas anti-corrupção, que compreendam acções e medidas dinâmicas, interligadas e complementares.

1.2.2. Específicos

Considera-se como os objectivos específicos deste trabalho:

1.      A elaboração do estudo do fenómeno de corrupção numa perspectiva sociológica, psicológica, jurídico e económico através da análise das suas causas e consequências;

2.      A análise do Procedimento para combater e a busca e observação do grau de corrupção com que o mesmo se processa, partindo-se da percepção dos cidadãos.

3.      Na apresentação da origem e definição do termo Corrupção;

4.      Na apresentação das diferentes tipologias do fenómeno;

5.      Na apresentação de algumas causas que possibilitam a aparição deste fenómeno.

Para a consecução dos objectivos específicos foi feita uma pesquisa, qualitativa explorativa, através da aplicação de bibliografias que servirão de apoio, bem como a da apreciação da percepção de corrupção no processo de socio-económico.

 

CAPÍTULO II 

 ENQUADRAMENTO TEÓRICO

2. Origem da Corrupção

A corrupção é um dos temas mais importantes na sociedade contemporânea, devendo as instituições promoverem ações de integridade. Este resumo procura entretanto uma releitura da sobre o fenômeno da corrupção com ênfase na abordagem da Sociologia, Psicologia, Jurídica e Econômica, a qual concede relevância às instituições na organização de procedimentos formais e informais. Não sabemos onde começa o mal, se nas palavras ou nas coisas, mas quando as palavras se corrompem e os significados tornam incertos, o sentido dos nossos actos e das nossas obras também é inseguro. As palavras, se apoiam em seus nomes e vice-versa. (SENIOR Ian, 2006). 

2.1. Surgimento da Palavra Corrupção

O uso constante das palavras e a atribuição de significados múltiplos que damos às mesmas, obriga os estudiosos ou pesquisadores a procurar a sua origem e sua história para entender a evolução do uso da palavra, seus diferentes significados. É por esta razão que procuramos entender qual a origem da palavra corrupção.

Segundo Llaca (2005), diz que:

Foi filósofo Aristóteles o primeiro a utilizar a palavra corrupção para designar a degeneração ocorrida nos governos monárquico e democrático e as suas formas de corrupção eram respectivamente a tirania, oligarquia e demagogia. Por sua vez, o Cícero, de acordo com a realidade vivida em Roma, empregaria esta palavra para descrever o suborno bem como o abandono dos bons costumes. (2005, p. 48).

A palavra corrupção deriva do latim, corruptus que, literalmente, significa quebrado em pedaços e em outra acepção: “apodrecido”, pútrido. Por conseguinte, o verbo corromper significa tornar pútrido, podre. A palavra corrupção pode significar a transformação do estado natural de uma coisa ou substância, especialmente, por putrefacção ou decomposição. A palavra serve também para qualificar o carácter degradado, infestado de mal, depravado, pervertido, malicioso e maligno. Llaca (2005).

A corrupção pode ser classificada em vários tipos: suborno, extorsão, nepotismo, clientelismo, fraude. Dois dos mais importantes tipos de corrupção para obter ganhos econômicos são a fraude (embezzlement) que está relacionada à apropriação indevida de recursos públicos e a propina (bribes), que envolve a apropriação dos recursos privados pelos funcionários do governo. Embora a corrupção apareça de muitas formas, o elemento comum é que um agente (geralmente um funcionário do governo) persiga ganhos ao negociar um item ou benefício sobre a tomada de decisões, mas que pertença a um principal o poder.

2.2. Definição da Corrupção

Para um melhor enquadramento deste trabalho, buscaremos uma definição mais precisa da corrupção, atendendo à sua utilização no campo das ciências económicas e sociais, bem como, a sua utilização pelas instituições internacionais especializadas no combate à corrupção. Apresentaremos a seguir, algumas definições de autores de diferentes domínios. 

Stephen D. Morris (1991:2-4) que realizou um interessante estudo sobre a corrupção no México, defende que: “A corrupção é o uso ilegítimo do poder público em benefício privado. Todo o uso ilegal ou não ético das actividades governamentais em função de interesses e benefícios pessoais ou políticos ou simplesmente o uso arbitrário do poder”.

 No domínio jurídico, selecionamos a definição do Andrade (2007:3) que afirma que:

 “A corrupção é um fenómeno social, através do qual um funcionário público é levado a actuar contra as leis, normas e práticas implementadas, a fim de favorecer interesses particulares”.

É necessário frisar que os actos de corrupção nem sempre se situam a nível do benefício individual, podem aspirar beneficiar familiares e amigos, ou mesmo movimentos sociais, políticos ou culturais. E é nesta lógica que o Llaca (2005), considera que existem dois tipos de corrupção: a corrupção dita “egoísta” e que serve apenas interesses individuais e a corrupção dita “solidária” que beneficia a interesses individuais e colectivos. Esta distinção pode revelar-se ambígua, na medida em que o egoísmo tanto pode ser grupal como individual. Llaca (2005, p. 50).

2.3. Tipos de Corrupção

A corrupção é um fenómeno que afecta todos os países, tanto desenvolvidos como em desenvolvimento, muito embora tivesse prevalecido, em determinada época, a crença de que se tratava de uma epidemia apenas marcante no terceiro mundo. Defendia-se que nos países desenvolvidos este fenómeno se encontrava sob controlo e que a corrupção em países em vias de desenvolvimento é maior que nos países desenvolvidos, devido à fragilidade dos serviços públicos, onde predominam os princípios patrimonialistas sobre o princípio de administração moderna. (SENIOR Ian, 2006, p. 40).

Todos os países são afectados por crimes de corrupção, desde uma troca de favores como acesso privilegiado a bens ou serviços públicos, até a sobre facturação de obras e serviços públicos para empresas privadas em troca de percentual do montante, em termos de comissão.

No contexto desse trabalho tentaremos apresentar os tipos de corrupção tidos em conta na Convenção das Nações Unidas Contra Corrupção, por tratar de um documento que derivou de um consenso alargado. Este tratado considera os seguintes tipos de corrupção: corrupção de agentes públicos nacionais, corrupção de agentes públicos estrangeiros e de funcionários de organizações internacionais públicas, peculato, apropriação ilegítima ou outro desvio de bens por um agente público, trafico de influencias, abuso de funções, enriquecimento ilícito, corrupção no sector privado, peculato no sector privado, branqueamento do produto de crime, ocultação, obstrução à justiça, responsabilidade das pessoas colectivas (Capítulo III, artigos 15 a 26 da Convenção das Nações Unidas). (SENIOR Ian, 2006, p. 40).

Corrupção de Agentes Públicos Nacionais – conforme o estabelecido na Convenção das Nações Unidas Contra Corrupção cada Estado deverá adoptar as medidas legislativas e outras que se revelem necessárias para classificar como infracções penais, quando praticados intencionalmente:

a)   A promessa, a oferta ou a entrega de, directa ou indirecta, de vantagens indevidas feita a um agente público, para ele ou para outra pessoa ou entidade, a fim de que pratique ou se abstenha de praticar um acto no exercício das suas funções.

b)  O pedido ou recebimento, directo ou indirecto, por parte de um agente público de vantagens indevidas, para ele ou para outra pessoa ou entidade, a fim de que pratique ou se abstenha de praticar um acto no exercício das suas funções. Ocampo (1993, p. 114, 115).

2.4. Corrupção de Agentes Públicos Estrangeiros e de Funcionários de Organizações Internacionais Públicas

1.   Cada Estado deverá adoptar as medidas legislativas e outras que se revelem necessárias para classificar como infracções penais, quando praticadas intencionalmente, a promessa, a oferta ou a entrega, dierecta ou indirecta, de vantagens indevidas feita a um agente público estrangeiro ou funcionário de uma organização internacional pública, para ele ou para outra pessoa ou entidade, a fim de que tal agente pratique ou se abstenha de praticar um acto no exercício das suas funções, tendo em vista obter ou conservar um negócio ou outra vantagem indevida no comércio internacional. Ocampo (1993, p. 114, 115).

2.   Cada Estado Parte deverá considerar a adopção de medidas legislativas e de outras que se revelem necessárias para classificar como infracções penais, quando praticadas intencionalmente, o pedido ou o recebimento, directo ou indirecto, por parte de um agente público ou funcionário de uma organização internacional pública de vantagens indevidas, para ele ou para outra pessoa ou entidade, a fim de que tal agente pratique ou se abstenha de praticar um acto no exercício das suas funções. Ocampo (1993, p. 114, 115).

Peculato, Apropriação Ilegítima ou Outro Desvio de Bens por um Agente Público - Cada Estado Parte deverá adoptar as medidas legislativas e outras que se revelem necessárias para classificar como infracções penais, quando praticados intencionalmente por um agente público, em proveito próprio, de outra pessoa ou entidade, a apropriação ilegítima ou o uso, para fins alheios àqueles a que se destinem, de quaisquer bens, fundos ou valores públicos ou privados, ou qualquer outra coisa de valor que lhe foram entregues em razão das suas funções. Ocampo (1993, p. 114, 115).

Tráfico de Influência - Cada Estado Parte deverá considerar a adopção de medidas legislativas e de outras que se revelem necessárias para classificar como infracções penais, quando praticadas intencionalmente:

a)      A entrega, directa ou indirecta, de vantagens indevidas feita a um agente público ou a qualquer outra pessoa, para que tal agente ou pessoa abuse da sua influência, real ou suposta, com o fim de obter de uma administração ou autoridade pública do Estado Parte vantagens indevidas em proveito do instigador da prática do acto ou de qualquer outra pessoa; 

b)      O pedido ou o recebimento, directo ou indirecto, por parte de um agente público ou de qualquer outra pessoa, de vantagens indevidas, para si ou para outra pessoa, para que tal agente ou pessoa abuse da sua influência, real ou suposta, com o fim de obter de uma administração ou autoridade pública do Estado Parte vantagens indevidas.

Abuso de Funções - Cada Estado Parte deverá considerar a adopção de medidas legislativas e de outras que se revelem necessárias para classificar como infracção penal, quando praticado intencionalmente, o uso abusivo das funções ou do cargo, isto é, a prática ou omissão de um acto, em violação das leis, por um agente público no exercício das suas funções, com o fim de obter vantagens indevidas para si, para outra pessoa ou entidade.

Enriquecimento Ilícito - Sem prejuízo da sua Constituição e dos princípios fundamentais do seu sistema jurídico, cada Estado Parte deverá considerar a adopção de medidas legislativas e de outras que se revelem necessárias para classificar como infracção penal, quando praticado intencionalmente, o enriquecimento ilícito, isto é, o aumento significativo do património de um agente público para o qual ele não consegue apresentar uma justificação razoável face ao seu rendimento legítimo.

Corrupção no Sector Privado - Cada Estado Parte deverá considerar a adopção de medidas legislativas e de outras que se revelem necessárias para classificar como infracções penais, quando praticadas intencionalmente, no decurso de actividades económicas, financeiras ou comerciais:

a)      A promessa, a oferta ou a entrega, directa ou indirecta, feita a qualquer pessoa que, a qualquer título, dirija uma entidade do sector privado ou nele trabalhe, de vantagens indevidas para ela ou para terceiros, a fim de que, em violação dos seus deveres, essa pessoa pratique ou se abstenha de praticar um acto.

b)      O pedido ou o recebimento, directo ou indirecto, por parte de qualquer pessoa que, a qualquer título, dirija uma entidade do sector privado ou nele trabalhe, de vantagens indevidas para si ou para terceiros, a fim de que, em violação dos seus deveres, essa pessoa pratique ou se abstenha de praticar um acto.

Peculato no Sector Privado - Cada Estado Parte deverá considerar a adopção de medidas legislativas e de outras que se revelem necessárias para classificar como infracções penais, quando praticadas intencionalmente no decurso de actividades económicas, financeiras ou comerciais, a apropriação ilegítima por parte de uma pessoa que, a qualquer título, dirija uma entidade do sector privado ou nele trabalhe, de quaisquer bens, fundos ou valores privados ou qualquer outra coisa de valor que lhe foram entregues em razão das suas funções. Ocampo (1993, p.  119).

2.5. Branqueamento do Produto do Crime

        1. Cada Estado Parte deverá adoptar, em conformidade com os princípios fundamentais do seu direito interno, as medidas legislativas e outras que se revelem necessárias para estabelecer como infracções penais, quando praticadas intencionalmente:

(a) (i) A conversão ou transferência de bens, quando o autor tem conhecimento de que esses bens são produto do crime, com o objectivo de ocultar ou dissimular a origem ilícita dos bens ou ajudar qualquer pessoa envolvida na prática da infracção subjacente a furtar-se às consequências jurídicas dos seus actos;

(ii) A ocultação ou dissimulação da verdadeira natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens ou direitos a eles relativos, sabendo o seu autor que esses bens são produto do crime;

(b) De acordo com os conceitos fundamentais do seu sistema jurídico: 

(i)      A aquisição, a posse ou a utilização de bens, sabendo aquele que os adquire, possui ou utiliza, no momento da recepção, que são produto do crime;

(ii) A participação em qualquer uma das infracções estabelecidas em conformidade com o presente artigo ou qualquer associação, conspiração, tentativa ou cumplicidade com vista à prática das mesmas, bem como a prestação de auxílio, assistência, facilitação e aconselhamento da prática dessas infracções.

Ocultação - Sem prejuízo do disposto no artigo 23º da presente Convenção, cada Estado Parte deverá considerar a adopção de medidas legislativas e de outras que se revelem necessárias para classificar como infracções penais, quando praticadas intencionalmente após a prática de qualquer uma das infracções estabelecidas em conformidade com a presente Convenção sem ter participado nelas, a ocultação ou conservação de bens, sabendo a pessoa que esses bens são provenientes de uma das infracções estabelecidas em conformidade com a presente Convenção.

Obstrução à Justiça - Cada Estado Parte deverá adoptar as medidas legislativas e outras que se revelem necessárias para classificar como infracções penais, quando praticados intencionalmente:

a)      O recurso à força física, a ameaças ou à intimidação, e a promessa, oferta ou concessão de um benefício indevido para obter um falso testemunho ou para impedir um testemunho ou a apresentação de elementos de prova num processo relacionado com a prática de infracções previstas na presente Convenção. Ocampo (1993, p. 117, 118).

2.6. CAUSAS DA CORRUPÇÃO

A corrupção, como podemos observar ao longo deste trabalho, é, pode assim dizer-se, imanente ao homem. Sempre existiu e persiste e, assim sendo, devem também perdurar os esforços para contê-la em níveis eticamente aceitáveis. Partimos do princípio de que uma sociedade onde se pretenda que prevaleça um nível baixo de corrupção deve primar por regras de imparcialidade e isenção em todos os níveis. Caso contrário haverá sempre injustiçados. Uma vez que corrupção irá sempre perdurar, torna-se necessário conhecer as suas raízes ou causas, de forma a melhor conhecer o fenómeno e poder tratá-lo.  Para efeito deste trabalho, vamos considerar as causas, as condições nas quais a corrupção tende a proliferar. Estas condições vão desde as imperfeições inatas do homem (por exemplo, um nível elevado de inveja, cobiça) até aos meios injustos empregues numa situação de concorrência (caso de eleições) e podem agravar-se devido a falhas no sistema judicial, administrativo, práticas políticas não éticas, injustiças económicas e sociais, etc. Ocampo (1993, p. 117, 118).

Ocampo Moreno (1993, 117-118), ao apontar as causas da hiper-corrupção, afirma que há factores pessoais, organizacionais e externos que irão exercer influência: 

"Pessoais com honestidade pessoal, nível de ambição, sentimento de integração ao grupo; da organização como, chefes corruptos, cultura de corrupção generalizada, possibilidade dos controlos detectarem o caso, nível de sanção em caso de detecção, possibilidade de realização pessoal de cada integrante, incentivos a honestidade externos, como, pressão externa (oferecimentos de coima ou extorsões), capacidade de adoptar decisões que afectam profundamente a outros, peso dos subornos oferecidos." 

Percebemos que existem diversas causas e que as mesmas estão interligadas, na medida que se influenciam entre si e geram efeitos. Entendemos dividi-las em quatro grupos: culturais, económico-sociais, políticas e jurídicas. Ocampo Moreno (1993, 117-118).

A interligação das causas e seus efeitos percebe-se facilmente com os exemplos abaixo descritos: 

·         A consolidação de uma cultura de exploração do homem pelo homem ao longo dos tempos, a impunidade de que gozam os mais fortes, em etapas sucessivas da nossa história, e outros factores culturais facilitam e encorajam a corrupção;

·         As profundas desigualdades no poder económico, onde uns são cada vez mais ricos e outros cada vez mais pobres; a marginalização e a acentuada injustiça social, associadas à ausência de um verdadeiro exercício da cidadania, tendo em vista um controlo social exigente e rigoroso, contribuem também para a proliferação da corrupção;

·         A falta de transparência do poder político, um nível baixo de democracia e políticos que não fazem da moral e da ética princípios fundamentais da sua acção, têm contribuído sobremaneira para que esse mal atingisse a dimensão actual.

A fraqueza no exercício do controlo interno e da auditoria; a ausência de legislação convincente e compatível ou a falta de aplicação oportuna, isenta e rigorosa quando esta exista; a excessiva morosidade dos tribunais e a distorção do verdadeiro sentido das imunidades políticas, são também factores determinantes para a promoção deste fenómeno. Ocampo (1993, p. 117, 118).

 

3. A CORRUPÇÃO NA PERSPECTIVA PSICOLÓGICA

O termo “corrupção” compreende uma variedade de comportamentos que têm como princípio a apropriação indevida de uma autoridade pública para fins privados, causando prejuízos materiais e morais a uma sociedade por operar contra a lei. Tal conduta causa impactos negativos em áreas como crescimento econômico, qualidade no fornecimento de serviços públicos, meio ambiente, níveis de desigualdade e até na credibilidade de um governo em negociações internacionais. Desta forma, se evidencia a urgência em desenvolver formas eficazes de combater a corrupção, que é um dos maiores desafios sociais desta época. (DUPUY, Kendra; NESET Siri. 2018).

Este comportamento é bastante complexo e possui múltiplas causas, e é necessário que se compreenda os mecanismos inerentes ao mesmo para elaborar estratégias mais eficientes para combatê-lo. (DUPUY, Kendra; NESET Siri. 2018).

3.1. Psicologia Cognitiva e Psicologia da Corrupção

A escassez de literatura sobre modelos teóricos sobre a psicologia da corrupção torna ainda mais difícil a compreensão sobre o tema, mas existem fontes que propiciam teorias pertinentes ao problema da corrupção e sua relação com a psicologia.  Nesse sentido, é explorada a abordagem da psicologia cognitiva e sua contribuição para um maior esclarecimento acerca deste fenômeno. Sob essa perspectiva, utiliza-se o termo “desengajamento moral” (moral disengajement) como fator central para ocorrência da corrupção e também para a sua previsão. Este termo define um processo cognitivo pelo qual um indivíduo reinterpreta seus conceitos morais de uma forma que possa modificar ou bloquear seu julgamento moral, se tornando capaz de realizar atos desumanos sem sofrer com uma grande quantidade de estresse ou culpa. (ABRAHAM; SULEEMAN; TAKWIN, 26, p.7-32).

O desengajamento moral ocorre por meio de sub processos cognitivos como: Simplificar um dilema por meio de racionalizações e eufemismos (deturpação cognitiva); minimizar o próprio papel na conduta ilícita ou admitir que a mesma é inevitável, deslocando a responsabilidade para as circunstâncias; reduzir a dissonância cognitiva desumanizando as vítimas ou culpando as mesmas pela ocorrência do ato corrupto. (ABRAHAM; SULEEMAN; TAKWIN, 26, p.7-32).

As racionalizações permitem que os indivíduos justifiquem seus atos para si mesmos e perpetuem a corrupção dentro de uma organização, tornando-a sistêmica e resistente. Outro pensamento comum em pessoas que cometem esse tipo de crime envolve o viés de reciprocidade, onde há uma cooperação como forma de “pagamento” por uma ajuda recebida anteriormente. Isso pode ser ilustrado pela ideia de que “você me ajuda e eu te ajudo”. Desta forma, é possível que uma relação de cooperação ilegal surja e se perpetue em uma organização. (ABRAHAM; SULEEMAN; TAKWIN, 26, p.7-32).

3.2. Psicologia da Corrupção

Também é possível analisar este comportamento sob uma perspectiva cognitiva na tomada de decisão. Um indivíduo faz operações mentais baseadas nos possíveis custos e benefícios oriundos de sua conduta, e decide executar a mesma se acreditar que os ganhos compensariam as possíveis perdas. Esse modelo ilustra o dilema que ocorre durante a tomada de decisão no comportamento corrupto, onde uma pessoa acaba escolhendo dar preferência a seus próprios interesses e prejudica os interesses da organização que pertence. (ABRAHAM; SULEEMAN; TAKWIN, 26, p.7-32).

Sabe-se que durante o processo de tomada de decisão, a antecipação mental dos cenários decorrentes possíveis é um fator crucial para a escolha da ação do indivíduo. Essa antecipação pode causar sensações positivas ou negativas, a depender das crenças que uma pessoa tem sobre a probabilidade da sua conduta lhe favorecer ou de lhe prejudicar. Desta forma, é provável que o comportamento corrupto ocorra com maior frequência em indivíduos que sentem mais emoções positivas advindas da antecipação de cenários favoráveis, como os lucros financeiros resultantes da ação criminosa. Desta forma, evidencia-se a complexidade que envolve o fenômeno e como pode ser difícil elaborar estratégias de enfrentamento eficazes contra esse problema. Esta dificuldade pode ser ilustrada pela pequena diminuição dos índices de corrupção em países avaliados como bastante corruptos, apesar do crescimento dos movimentos e campanhas contrários a essa conduta criminosa. Os planos de enfrentamento precisam de informações mais embasadas cientificamente para poderem direcionar seus esforços em variáveis que realmente possuem influência relevante no surgimento e reprodução de actos corruptos. (DUPUY, Kendra; NESET Siri. 2018).

Posições de poder também demonstram aumentar as chances de que uma pessoa aja de forma corrupta. É possível que obter poder incite modificações cognitivas acerca do julgamento moral de um indivíduo, permitindo que o mesmo tenha uma maior inclinação para cometer actos ilícitos. Além disso, existem traços comportamentais narcisistas que podem ser exacerbados quando alguém se encontra numa situação de superioridade. Uma pessoa pode começar a acreditar que merece algum tipo de tratamento especial e que não precisa respeitar certas regras, o que pode se tornar bastante prejudicial para a estrutura de um grupo ou organização. (DUPUY, Kendra; NESET Siri. 2018).

Esse evento se torna ainda mais recorrente em indivíduos que possuem níveis altos de testosterona. De facto, há estudos demonstrando a influência desta substância no comportamento corrupto e como esta é um dos fatores preditores para o mesmo. Mais uma vez se explicita a complexidade que envolve as causas da corrupção, de modo que até aspectos hormonais participam de forma relevante na ocorrência deste comportamento. (DUPUY, Kendra; NESET Siri. 2018).

Como foi dito, o poder parece exercer grande influência em quem o detêm. Isso significa que a tomada de decisão frente ao dilema de agir de forma corrupta não envolve apenas fatores externos ou internos ao indivíduo, mas justamente a sua compreensão acerca dos dois e como estes influenciam seus processos cognitivos. Não existe um fator único que sirva como preditor de corrupção, nem tampouco é possível assegurar que alguém não agirá de forma imoral em circunstâncias diversas. Sabe-se que as características de honestidade não demonstraram garantir que uma pessoa continuará agindo de forma honesta à medida que conquista mais poder. (DUPUY, Kendra; NESET Siri. 2018).

4. A CORRUPÇÃO NA PERSPECTIVA JURÍDICAS SUAS CAUSAS

Destacaremos algumas situações no sistema jurídico que concorrem para ocorrência da corrupção:

4.1. Brandura das Penas 

As sanções penais devem exercer um papel educativo preventivo, ou seja, devem ter uma função inibidora das práticas ilícitas, logo não devem ser brandas, pois deste modo, deixam de produzir coação psicológica. Por isso os legisladores ao estabelecerem a pena, devem fazê-lo considerando sempre os prejuízos materiais e morais que o delito provoca.   Batista (2000, p.76).

4.2. Ineficácia do Sistema Judicial

Quando o sistema judicial conta com normas e procedimentos com lacunas que permitem vários tipos de recursos judiciais, haverá por conseguinte congestionamento na justiça, morosidade e impunidade. Nos países onde se observam normas e procedimentos judiciais desfasados, um bom advogado, ou seja, o poder financeiro e a influência política podem ser sinónimos de impunidade. Batista (2000, p.76).

“O tráfico de influências é, indiscutivelmente, o mais poderoso instrumento da corrupção. Os grupos que o exploram, estão constantemente a aperfeiçoar as suas técnicas e meios, pelo que são de grande valia as reciclagens periódicas dos métodos usados para conter ou, pelo menos, reduzir as andanças desse gigante. Embora suas pegadas sejam observáveis desde as mais longínquas civilizações, é no século XX que as suas forças se agigantaram, sacudindo todas as nações e países”. Batista (2000, p.76).

4.3. Ausência ou Inoperância de Normas que Regulam a Elegibilidades  

Os políticos fecham-se na sua cegueira egoísta (limitam-se, muitas vezes, às suas ambições pessoais ou do grupo a que pertencem, sem se preocuparem com o interesse de toda uma sociedade), preocupando-se apenas com a manutenção do poder e dos seus benefícios, e estão geralmente indiferentes à criação de normas com critérios claros, que não deixem lugar a várias interpretações, para prever mecanismos de elegibilidade. É necessário que a legislação preveja período de elegibilidade para cada cargo, tendo em conta cada tipo de infracção a cometer pelo político. (SENIOR Ian, 2006).

4.4. Ausência ou Inoperância de Normas que Regulam a Criminalidade Económica e Branqueamento de Capital 

A criminalidade económica e financeira, o crime organizado de uma forma geral, é actualmente objecto de preocupação internacional em termos jurídicos e económicos. A criminalidade económica geralmente se apoia em estruturas e dispositivos existentes nas sociedades frágeis, particularmente naquelas onde as infracções comerciais não se confrontam com a responsabilidade legal, existindo, antes um ambiente propício para operações de branqueamento de capital e práticas que atentam, de forma geral, contra o bem estar social. (SENIOR Ian, 2006).

O crime organizado, como por exemplo, as grandes operações de venda de droga, movimenta somas elevadíssimas. Trata-se do chamado “dinheiro sujo” que circula fora do sistema bancário. O branqueamento desse dinheiro não acontece sem novos crimes de corrupção e quanto mais se “limpar” capital do género, mais forte serão novas acções criminosas, como é o caso do terrorismo. (SENIOR Ian, 2006).

O desenvolvimento de uma sociedade depende em certo grau da eficácia do combate à criminalidade económica altamente organizada, pelo que é imperativo a adopção de normas que visem o combate deste crime. A nível internacional, foram adoptados alguns dispositivos, como a Convenção OCDE, que visa combater essencialmente o crime de corrupção de agentes públicos estrangeiros nas transecções comerciais internacionais e a Convenção das Nações Unidas, celebrado em 1988, contra a criminalidade transnacional organizada. (SENIOR Ian, 2006, p. 67).

4.4.1. A Desarticulação dos Órgãos de Controlo

Deve-se evitar toda e qualquer estrutura que faculte o monopólio de uma organização, elevado grau de poderes discricionários dos dirigentes e/ou funcionários, baixo nível de transparência e controle, na medida que são ambientes propícios e proporcionadores de corrupção.

A corrupção é um fenómeno que exige um alto grau de organização, por isso, só uma sociedade organizada e bem articulada poderá enfrentar de forma vitoriosa tal desafio. Trata-se de um fenómeno cujo combate exige uma efectiva conjugação de esforços, uma articulação bem sucedida entre o sistema judicial, o executivo e o legislativo. Mesmo um Estado bem articulado enfrenta desafios enormes para fazer face à corrupção, porque, conforme explana Batista (2000), “por paradoxal e absurdo que seja ou que possa ser, o poder da corrupção é invencível, em virtude de ser alimentado em suas entranhas pelo egoísmo da natureza humana. Batista (2000, p.136).

4.4.2. Ineficácia dos Controlos Oficiais

O controlo das acções dos governantes com vista a prevenir e/ou pôr cobro a actos de corrupção deparam muitas vezes com a resistência do próprio Estado. Os partidos ou grupos que estão no poder têm tendencialmente dificuldades de reconhecer que existe corrupção no seu governo, pois, para além de nenhum partido querer enfrentar escândalos enquanto estiver no poder, a maioria deles patenteia a intenção de tirar vantagens particulares desses actos. Por isso, dificilmente há vontade política para o efeito.  Batista (2000, p. 134).

Uma outra questão é o facto de em muitos países ainda não existir a cultura de controlo interno ao nível dos distintos sectores do Estado.  Normalmente existe o controlo Parlamentar, que é assente, geralmente, apenas ao nível do Executivo, e conta normalmente com muita deficiência. Porque é mais fácil haver controlo interno, neste caso, o executivo ele mesmo, estar interessado a si controlar. Batista (2000, p. 134).

O facto dos deputados não estarem, muitas vezes, em exclusividade de funções, cria uma controvérsia: uma situação em que a independência, a autonomia, imparcialidade e o rigor no papel de controlo e fiscalização dos mesmos pode ser posto em causa. Em todo caso a tal independência que se defende é relativa, uma vez que se por um lado o deputado pode sentir-se livre para inspeccionar o executivo, nos casos em que fosse profissionalizado, por outro pode estar preso a certas exigências do Partido do qual faz parte. Batista (2000:134).

4.4.3. Parcialidade e subordinação dos envolvidos 

“Independência e saber jurídico são o principal suporte do Poder Judiciário, o que vem ocorrendo em alguns países, entre os quais: os EUA, a Grã-Bretanha, a França, a Alemanha, a Itália e o Japão” Batista (2000:134).

As entidades responsáveis pela “investigação “não devem ter dependência em relação a entidades envolvidas. A subordinação da Polícia de Investigação Criminal ao Ministério (como acontece em alguns países) leva a uma impotência e a ineficácia em termos de apuração dos factos, principalmente quando existe envolvimento de superior hierárquico. (SENIOR Ian, 2006)

5. A CORRUPÇÃO NA PERSPECTIVA JURÍDICO-SOCIOLÓGICA

A palavra corrupção no seu sentido social e legal é uma acção humana que viola as normas legais e os princípios ético. A corrupção está intimamente ligado ao poder, se entrelaçam, crescem e se agigantam sempre que encontram terreno e clima favoráveis. Poderíamos ser levados a pensar que esta aliança se nutre do egoísmo e da ambição que sempre associamos ao poder e à corrupção. Mas pensando bem, tanto o interesse próprio como a ambição podem ser, desde que bem enquadradas, as grandes molas impulsionadoras de serviço aos outros. Sob o prisma léxico, múltiplos são os significados do termo corrupção. Tanto pode indicar a ideia de destruição como a de mera degradação, ocasião em que assumirá uma perspectiva natural, como acontecimento efectivamente verificado na realidade fenomênica, ou meramente valorativa. Como já tivemos oportunidade de afirmar1, a corrupção, tal qual o câncer, é um mal universal. (SENIOR Ian, 2006).

A inevitabilidade do fenômeno não passou despercebida à própria Bíblia, sendo encontrada no Êxodo, Capítulo XXIII, Versículo 8, a seguinte passagem relativa às testemunhas: Também presente não tomarás: porque o presente cega os que têm vista, e perverte as palavras dos justos. No Deuteronômio, Capítulo 16, Versículo 18, na disciplina concernente aos deveres dos juízes, está dito que não torcerás o juízo, não farás acepção de pessoas, nem tomarás peitas; porquanto a peita cega os olhos dos sábios, e perverte as palavras dos justos. Em Isaías, Capítulo 1, Versículos 21 a 23, é analisada a corrupção na polis: 

Como se prostituiu a cidade fiel, Sião, cheia de retidão? A justiça habitava nela, e agora são os homicidas. Tua prata converteu-se em escória, teu vinho misturou-se com água. Teus príncipes são rebeldes, cúmplices de ladrões. Todos eles amam as dádivas e andam atrás do proveito próprio, não fazem justiça ao órfão e a causa da viúva não é evocada diante deles. Por ser a corrupção um fenômeno universal, nos pareceu relevante uma análise, ainda que breve, de alguns de seus principais aspectos. Além disso, o termo corrupção, aos olhos do leigo e de não poucos operadores do direito, é o elemento aglutinador das condutas mais deletérias à função pública, isto sem olvidar a degradação de caráter que indica ao mais leve exame. (SENIOR Ian, 2006).

5.1. Corrupção e Democracia

A democracia, na medida em que permite a ascensão do povo ao poder e a constante renovação dos dirigentes máximos de qualquer organização estatal, possibilita um contínuo debate a respeito do comportamento daqueles que exercem ou pretendem exercer a representatividade popular, bem como de todos os demais fatos de interesse colectivo. (PINDYCK E RUBINFELD, 2010, p. 561).

A partir dessa singela constatação, é possível deduzir que os regimes ditatoriais e autocráticos, por serem idealizados e conduzidos com abstração de toda e qualquer participação popular, mostram-se como o ambiente adequado à aparição de altos índices de corrupção. A debilidade democrática facilita a propagação da corrupção ao aproveitar-se das limitações dos instrumentos de controle, da inexistência de mecanismos aptos a manter a administração adstrita à legalidade, da arbitrariedade do poder e da consequente supremacia do interesse dos detentores da protestas publica face ao anseio colectivo. (PINDYCK E RUBINFELD, 2010, p. 561).

O combate à corrupção não haverá de ser fruto de mera produção normativa, mas, sim, o resultado da aquisição de uma consciência democrática e de uma lenta e paulatina participação popular, o que permitirá uma contínua fiscalização das instituições públicas, reduzirá a conivência e, pouco a pouco, depurará as ideias daqueles que pretendem ascender ao poder. Com isto, a corrupção poderá ser atenuada, pois eliminada nunca o será. A corrupção, em verdade, sempre existiu. (PINDYCK E RUBINFELD, 2010, p. 561).     

6. A CORRUPÇÃO NO ÂMBITO ECONÓMICO E SOCIAL SUAS CAUSAS

Do ponto de vista econômico, a relação agente-principal é abordada como parte do estudo dos mercados com informações assimétricas, ou seja, quando algumas partes possuem mais informações do que outras. O agente representa a pessoa atuante e o principal, a parte que é afetada pela ação do agente. A interação desses atores, que pode ocorrer tanto na esfera privada quanto na pública, denomina-se de problema da relação agente-principal, o qual consiste pela possibilidade dos agentes perseguirem suas próprias metas ao invés das metas desejadas pelos principais. (PINDYCK E RUBINFELD, 2010, p. 561).

A análise da relação agente-principal na administração pública é importante na compreensão e na avaliação do comportamento dos agentes públicos. Por exemplo, alguns agentes públicos encontram-se interessados em poder ou em gratificações, objetivos que podem ser alcançados expandindo-se o órgão para além do seu nível ‘eficiente’. (PINDYCK E RUBINFELD, 2010, p. 564).

Para enfrentar o problema da relação agente-principal, algumas medidas podem ser adotadas, de forma a tornar a relação mais eficiente, como, por exemplo, a alteração na política de salários de forma a impedir que funcionários do governo se sintam ‘atraídos’ a agirem de forma oportunista, o aperfeiçoamento nos mecanismos de controle sobre os funcionários do governo por parte dos órgãos de supervisão e a mobilização dos cidadãos para destituir os administradores públicos que atuem de forma ‘ineficiente’ dos seus cargos. (SENIOR Ian, 2006).

Em países em que o índice de corrupção é elevado geralmente perde-se a noção do bem comum, que, como define o Martins é o próprio bem particular de cada indivíduo, enquanto este é parte de um todo ou de uma comunidade: "O bem comum é o fim das pessoas singulares que existem na comunidade, como o fim do todo é o fim de qualquer de suas partes". Ou seja, o bem da comunidade é o bem do próprio indivíduo que a compõe.  A corrupção como problema político econômico, cultural e administrativo se manifesta de forma diferente nos diversos países. Sendo assim, torna-se necessário uma medição do fenômeno da corrupção em perspectiva comparada. (SENIOR Ian, 2006).

6.1. Algumas Abordagens Teóricas da Corrupção na Economia

O intuito deste ponto não é discutir em profundidade as abordagens teóricas sobre a corrupção, mas apresentar em linhas gerais o desenvolvimento da questão na economia. Para alguns teóricos, como Leff (1964) e Nye (1967), sob condições específicas, a corrupção até melhora os resultados econômicos. Para esses autores, se as empresas e os indivíduos enfrentam grandes quantidades de burocracia, por exemplo, a corrupção ajuda-os a reduzir seus custos monetários e temporais, permitindo mais inovação, criação de negócios, comércio e crescimento econômico (ACKERMAN E PALIFKA, 2016).

Para Nye (1967) a corrupção controlada pode contribuir para o desenvolvimento econômico de três modos: pela formação de capital, pela redução da burocracia e pelo incentivo ao empreendedorismo. A corrupção, de maneira geral, para esses teóricos, funcionava como uma “graxa” que lubrifica a economia (“greesing the whells”), benéfica para a eficiência econômica e a sua abordagem não deveria levar em consideração aspetos morais.  

6.2. CONSEQUENCIAS DA CORRUPÇÃO

De acordo com as causas acima expostas e os seus efeitos, de antemão podemos prever que a corrupção é um fenómeno que tende a favorecer a consolidação de elites e burocracias políticas e económicas. Logo, deteriora a credibilidade e legitimidade dos Governos e reproduz uma concepção patrimonialista do poder. Reduz o nível de cobranças fiscais e impede que os escassos recursos públicos coadunam com o desenvolvimento e o bem-estar social. É um fenómeno que se manifesta em qualquer Estado ou regime político e não constitui privilégio de tiranias ou democracias. Não é próprio de países em via de desenvolvimento, pois ocorre em toda e qualquer sociedade organizada. Bem certo é, que quanto mais bem organizada, livre e responsável for a sociedade, mais apta estará para o enfrentar ou reprimir a corrupção. (SENIOR Ian, 2006)

6.2.1. Custos Económicos

Neste mundo cada vez mais globalizado, a elevação de competitividade é um desafio para com o qual os países confrontam na luta pela expansão do seu potencial económico. Pois, os países precisam reunir condições para que possam produzir de forma mais eficiente, o que certamente exige, que se aproveite ao máximo os recursos disponíveis da economia e se explore as oportunidades de investimento interessantes que forem surgindo.  Quando não, a corrupção pode lesar a competitividade do país ao elevar o custo do investimento produtivo e tornar o ambiente de negócios menos estável, uma vez que, as empresas não terão o controlo daquilo que deverão orçar em termos de valor adicional que lhes venha a permitir a viabilidade. BATISTA, (2012, p. 7-42).

Como já referimos, na cena actual, ser eficiente na produção e ter custos mais baixos são factores determinantes da competitividade. Por isso os países, tendo em conta as novas estratégias internacionais de competitividade, devem utilizar métodos comparativos de vantagens que se baseavam na redução de custos e na melhoria da qualidade. BATISTA, (2012, p. 7-42).

 

 

 

 

7. CONSIDERAÕES FINAIS

 

Tendo em conta as perspectivas criadas para o concreto deste trabalho, portanto o facto do trabalho se ter baseado numa definição de corrupção do Senior, que dispõe de um carácter universal permitiu-nos não só abordar o tema tendo em conta o sector público e privado, mas também não nos prendermos demasiado com questões ligadas ao tempo, lugar, legislação e códigos morais específicos. 

Vimos que a corrupção pode manifestar-se de diversas formas, ganhar vários significados e que são vários os tipos de corrupção existentes, tal como nos apresenta a Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção, ratificada por diversos Estados.  Podemos constatar que corrupção provém de diversas causas: sociológica, psicológica, económicas, culturais, políticas e jurídicas.  Está patente que é a corrupção, a nível económico, provoca má afectação dos recursos, já que os subornos pagos pelos privados para consecução de uma obra ou fornecimento de um serviço fazem com que o serviço prestado tenha menos qualidade e saia um custo mais elevado. Constata-se, por outro lado, que a corrupção inibe o investimento estrangeiro e provoca a queda deste, empobrecendo desta forma, o país e agudizando os seus desequilíbrios.  (SENIOR Ian, 2006).

Ao nível social, a prática desse fenómeno, faz agravar as desigualdades entre os cidadãos (intensificando o fosso entre os ricos e os pobres) e degrada os valores morais, éticos e profissionais. A nível político, a corrupção, pode subverter o processo democrático, sendo que, a nível judicial, entre outros efeitos, tende a minar a economia de mercado quando não haja garantia de direito de propriedade. Observou-se que as mesmas entidades vocacionadas para combater a corrupção, são as mesmas que beneficiam deste fenómeno, como é o caso dos políticos, daí a dificuldade de se combater o fenómeno. Para se pôr cobro ao mesmo, seria necessário que as acções de combate à corrupção visassem tanto a corrupção política como a burocrática e que tais acções compreendessem medidas que se interligassem e complementassem, nomeadamente a prevenção, a acção administrativa e a acção judicial. 

Portanto, seria ainda imprescindível a existência de uma sociedade civil activa, livre, vigilante, participativa e dinâmica, integrada por pessoas mais responsáveis, exigentes e íntegras, assim como um Governo cuja legitimidade assentasse mais no respeito pelos princípios de um Estado de Direito, tendo em vista uma política de “tolerância zero” face à corrupção.

 

8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS E OUTRAS FONTES

 

·         SENIOR, Ian (2006), Corruption- The World’s Big C, Editora Great Britain.

·         OCAMPO, Luís Moreno (1993), En Defensa Propia, Como Salir de La Corrupción, Editorial Sudamericana, Buenos Aires.

·         BATISTA, Mariana; MARQUES, Radamés. Instituições Políticas e Corrupção: uma Análise da Literatura Comparada. Revista Política Hoje. Vol. 21, n. 1, pp. 7-42, 2012.

·         ABRAHAM, Juneman; SULEEMAN, Julia; TAKWIN, Bagus. The Psychology of Corruption: The Role of the Counterfeit Self, Entity Self-Theory, and Outcome-Based Ethical Mindset. Journal Of Psychological & Educational Research, Jacarta, v. 2, n. 26, p.7-32, 1 dez.

·         ACKERMAN, S.R & PALIFKA, B. J. Corruption and Government: causes, consequences and reform. Cambridge University Press, 2016.

·         LEFF, Nathaniel. Economic Development through Bureaucratic Corruption. American Behavioral Scientist, p. 8-14, 1964.

·         NYE, Joseph Nye. Corruption and Political Development: A Cost-Benefit Analysis. The American Political science Review. Vol.61, n.2, p.417-427, jun. 1967. 

·         DUPUY, Kendra; NESET Siri. The cognitive psychology of corruption: Micro-level explanations for unethical behaviour. U4 Anti-corruption centre, 2018.2.

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